HabilitaçãoQuestões sobre Licitações

Erro material – Erro de preenchimento de declaração

Fui participar de uma licitação e fui inabilitado por ter colocado em uma das tantas declarações no cabeçalho o nome de outra Prefeitura, procede ou posso entrar com o recurso e como 

Entendo que este equívoco deve ser enquadrado como “erro material”, que não deveria motivar a inabilitação.

Cumpre-nos revolver um velho tema já publicado na internet, que diz respeito ao erro formal e o erro material, nos assuntos relacionados ao procedimento licitatório.

Erro formal:
O erro formal não vicia e nem torna inválido o documento. Haverá um erro formal no documento quando for possível, pelo contexto e pelas circunstâncias, identificar a coisa ou validar o ato.

Se um documento é produzido de forma diferente da exigida, mas alcançou os objetivos pretendidos ou a finalidade essencial, reputar-se-á válido (ex.: uma proposta foi manuscrita quando deveria ser datilografada ou impressa; uma proposta foi apresentada em modelo diverso do edital, mas obedeceu a todo conteúdo exigido). Segundo o princípio da instrumentalidade considerar-se-á válido um documento que, embora produzido de forma diferente da exigida, ainda assim, atingir a finalidade pretendida.

Exemplos de erro formal em licitação: o erro de identificação do envelope sanado antes da sua abertura; a ausência de numeração das páginas da proposta ou documentação; os documentos colocados fora da ordem exigida pelo edital; ausência de um documento cujas informações foram supridas por outro documento constante do envelope; declaração diferente do modelo apresentado pelo edital, mas que apresenta todas as informações necessárias.

O Código Civil deixa claro que o erro não viciará a declaração quando, por seu contexto e pelas circunstâncias, puder ser identificada a coisa ou a pessoa (art. 139). MARCUS CLÁUDIO ACQUAVIVA definiu a questão com clareza ao comentar o artigo 91 do CC (de 1916) :

“Assim dispõe o CC no art. 91: ‘O erro na indicação da pessoa, ou coisa, a que se referir a declaração de vontade, não viciará o ato, quando, por seu contexto e pelas circunstâncias, se puder identificar a coisa ou pessoa cogitada’. Eis o erro acidental, que, ao contrário do erro substancial (arts. 86 a 88 do CC), é perfeitamente sanável, desde que atendidos os requisitos do dispositivo supra.”(grifo nosso) (in Dicionário Jurídico Brasileiro, ed. Jurídica Brasileira)

Erro material:

É o chamado erro material de fácil constatação, perceptível à primeira vista. Não carece de maior exame para detectar que há um flagrante desacordo entre a vontade e o que de fato foi expressado no documento. Não há necessidade de recorrer a interpretação de conceito, estudo ou exame mais acurado para detectar esse erro; ele é percebido por qualquer pessoa.

É o erro “grosseiro”, manifesto, que não deve viciar o documento. Nesse caso repara-se o erro material.

Exemplos de erro material que exigem correção e saneamento: é a decisão do pregoeiro que inabilita um licitante pela falta de um documento que notadamente fora apresentado; erro aritmético (de cálculo) do valor da proposta (os preços unitários estão corretos, mas a soma ou a multiplicação está incorreta); a decisão do pregoeiro evidentemente incorreta (o licitante foi habilitado, mas na decisão constou “inabilitado”); na decisão constou uma data errada (02/10/2010, quando o correto seria 02/10/11) e por esse fato uma determinada empresa foi prejudicada; a numeração incorreta das folhas dos documentos de habilitação, corrigida pelo pregoeiro na própria sessão; decisão com data ou indicação de fato inexistente; indicação equivocada do nº da licitação.

Em suma, o erro material exige a correção uma vez que retrata a inexatidão material, ou seja, reflete uma situação ou algo que obviamente não ocorreu.

“Erro material é o reconhecido primu ictu oculi, consistente em equívocos materiais sem conteúdo decisório propriamente dito, como a troca de uma legislação por outra, a consideração de data inexistente no processo ou uma inexatidão numérica; e não, aquele que decorre de juízo de valor ou de aplicação de uma norma jurídica sobre o(s) fato(s) do processo” (STJ, REsp 1.021.841/PR, Rel. Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 7.10.2008, DJe 4.11.2008)

Neste caso específico, entendo que o vício (da declaração) é sanável. O erro de cabeçalho ou de indicação do destinatário, configura “erro material” (de digitação), ou seja, de pouca importância e que obviamente não compromete a validade da declaração, sobretudo quando o conteúdo do documento for compreensível e cumprir a exigência a que se destina.

É irregular a desclassificação de proposta vantajosa à Administração por erro de baixa materialidade que possa ser sanado mediante diligência, por afrontar o interesse público. (Acórdão TCU 2239/2018 Plenário).

Atualmente, até mesmo a “falta” da declaração tem sido objeto de saneamento da documentação, conforme recente posicionamento do Tribunal de Contas da União:

“Na falta de documento relativo à fase de habilitação em pregão que consista em mera declaração do licitante sobre fato preexistente ou em simples compromisso por ele firmado, deve o pregoeiro conceder-lhe prazo razoável para o saneamento da falha, em respeito aos princípios do formalismo moderado e da razoabilidade, bem como ao art. 2º, caput, da Lei 9.784/1999” (Acórdão 988/2022 Plenário)

Publicado em 11 de outubro de 2022

(Colaborou Dr. Ariosto Mila Peixoto, advogado especializado em licitações e contratos administrativos, no escritório AMP Advogados).

*Alguns esclarecimentos foram prestados durante a vigência de determinada legislação e podem tornar-se defasados, em virtude de nova legislação que venha a modificar a anterior, utilizada como fundamento da consulta

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