O regime foi concebido e estruturado para reger uma situação passageira e, por consequência, com data certa para encerrar sua eficácia. A despeito dessa incontroversa limitação temporal, a Lei 12.688/2012 alterou o RDC para incluir uma nova hipótese de incidência, que transcende a ocorrência dos aludidos eventos esportivos: trata-se de sua extensão para ações integrantes do Programa de Aceleração de Crescimento (PAC), sem data certa para se encerrar.
Como se isso não bastasse, vem agora essa nova proposta,contida no Projeto de Lei de Conversão 16, já aprovada pelo Congresso Nacional, buscando ampliar ainda mais o lapso temporal de sua utilização, para fazê-la incidir na consecução de obras e serviços de engenharia no âmbito dos sistemas públicos de ensino, ou seja, para sempre.
Ora, essas sucessivas inclusões no texto legal acabam conferindo àquele Regime Diferenciado, que serviria a um propósito específico e que detinha uma vigência limitada no tempo, uma inconsistente e indesejada ultra- atividade.
A interpretação que melhor se amolda ao caso, conquanto não seja a ideal, mas que procura superar os entraves de sua inconstitucionalidade, é a de que essas licitações para obras e serviços utilizando o sistema somente poderão ocorrer até o advento das Olímpiadas em 2016: decorrido esse período determinado, suas emanações devem ser imediatamente cessadas.
Não resta dúvida que a Lei de Licitações está a merecer uma reforma, principalmente pela existência de uma série de situações hodiernamente não albergadas por ela. Todavia, é fundamental que tais alterações sejam realizadas da maneira mais democrática e sistemática possíveis, e não com inclusões sucessivas, desordenadas e casuísticas (no caso, até mesmo demagógica, poder-se-ia dizer), que somente têm o condão de conferir perenidade para algo que já nasceu com data certa para se extinguir.
Essa questão traz consigo uma reflexão fundamental —encerrado o prazo de vigência do RDC, poderá ele sobreviver pela mera referência à sua aplicação em casos diversos dos originalmente previstos? Ou será aplicável apenas enquanto mantiver sua eficácia original?
Por todos esses questionamentos é que mais uma vez se confirma a imperiosidade do processo legislativo formal, que certamente elaborado com mais detença inovará na ordem jurídica sem que ocorram os paradoxos apontados, que geram total insegurança jurídica e abalam o Estado de Direito. Mormente quando verdadeiros remendos legislativos são realizados por sucessivas conversões de medidas provisórias, que, pela sua própria característica constitucional, servem para disciplinar situações de relevância e urgência.
Parece-me realmente equivocada a convivência de dois regimes “gerais” de contratações públicas, que não encontram respaldo constitucional para coexistirem. O RDC não pode —pelos mecanismos legislativos utilizados— ressurgir continuamente das próprias cinzas.
Por Augusto dal Pozzo
(Fonte: Consultor Juridico)