A doutrina desde há muito tempo assevera que, para cessar a vigência de uma lei ou de um dispositivo, não é necessário que nova lei formal revogue a anterior. O preceito que faz cessar sua força obrigatória pode estar implícito na própria lei, bastando, para sua constatação, uma visão sistemática de suas emanações.
Nesse sentido, algumas hipóteses podem ser encarecidas, consoante entendimento doutrinário de Vicente Ráo, registrado em sua reconhecida obra “O Direito e a Vida dos Direitos”: (i) a lei, de maneira expressa, já limita o tempo de sua vigência; (ii) a lei, por sua própria natureza, já possui uma temporariedade, como é o caso das leis orçamentárias que disciplinam um exercício financeiro específico; (iii) a lei, por se destinar a fim certo e determinado, esgota-se quando seu conteúdo é atingido, como o caso da lei que manda pagar uma subvenção e, finalmente, (iv) a lei rege uma situação passageira ou um estado de coisas não permanente, verbi gratia, quando a lei prevê situações de emergência resultantes de calamidades, situações temporárias, dentre outras.
Quando a obrigatoriedade de uma lei cessa por força de outra lei, ocorre a chamada revogação, que pode ser total (ab-rogação) ou parcial (derrogação), devendo, em princípio, o preceito revogatório ou derrogatório advir do mesmo nível hierárquico que editou a norma que se revoga ou que se derroga parcialmente. Dessa maneira, a lei se revoga (ou se derroga) por outra lei; o decreto, por outro decreto e assim sucessivamente.
O Regime Diferenciado de Contratações, em sua redação original, tinha vigência determinada no tempo, uma vez que condicionada à realização dos eventos esportivos que acontecerão no Brasil até o ano de 2016: essa é a interpretação que se depreende, sem maiores esforços exegéticos, do disposto no artigo 1º do Regime Diferenciado de Contratações, desconsiderando, nesse momento, qualquer alteração posterior a sua vigência originária.
Trata-se de lei, como vimos acima, que se caracteriza por trazer em suas próprias emanações, o preceito que faz cessar a sua força obrigatória, de maneira a estabelecer um fim certo e determinado e de maneira explícita, diga-se de passagem.
Não é por outro motivo que a doutrina mais abalizada, como aquela defendida por Maurício Zockun, sustenta que o aludido Regime Diferenciado de Contratações é uma lei especial que veicula norma especial, já que se encontra restrito (i) apenas às relações jurídicas patrimoniais necessárias, direta ou indiretamente, à realização dos já mencionados eventos esportivos; (ii) cuja observância é obrigatória pelos entes públicos que pretendam travar relações patrimoniais volvidas a esses específicos propósitos; (iii) razão porque expressamente afastou o regime geral da Lei Federal 8.666/1993; e (iv) fixou-lhe vigência determinada no tempo, qual seja, até a realização daqueles eventos.
Não se trata aqui de examinar a inconstitucionalidade do RDC por afronta ao disposto no artigo 22, XXVI da Constituição Federal, mas salientar essa especial característica: sua vigência encontra-se limitada no tempo.