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Lei 14.133/21: documentos equivalentes em licitações internacionais

Qual o critério para a aceitabilidade de documentos estrangeiros em licitações internacionais?

A resposta a essa pergunta: existem vários critérios a serem considerados de maneira integrada.

Primeiramente, o artigo 52 da Lei nº 14.133/2021 estabelece que “nas licitações de âmbito internacional, o edital deverá ajustar-se às diretrizes da política monetária e do comércio exterior e atender às exigências dos órgãos competentes”, mas não há no texto um detalhamento dessas definições.

Sabe-se que edital de licitação internacional precisa regrar questões como credenciamento de representante legal de estrangeiros, equalização de propostas, legalização de documentos estrangeiros, ofertas em moedas estrangeiras, Código da Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM) dos produtos, Termo de Comércio Internacional (Incoterm) para o futuro contrato de comércio exterior, entre outras.

E os artigos 62 a 70 da nova lei, que tratam de requisitos de habilitação, devem ser observados por empresas brasileiras e estrangeiras, mas com a ressalva do parágrafo único do seu artigo 70, de que “as empresas estrangeiras que não funcionem no país deverão apresentar documentos equivalentes, na forma de regulamento emitido pelo Poder Executivo Federal”.

Ainda que pendente de edição o mencionado regulamento, são três os pressupostos para as licitações internacionais:

1) Respeito às diretrizes da política monetária, como se exemplifica da normatização relativa ao controle do meio circulante no país, inclusive a vedação de pagamentos diretos em moeda estrangeira como se estivesse em curso no território nacional, pois para situações relacionadas ao cumprimento de obrigações existem regras sobre o câmbio;

2) Respeito às diretrizes de comércio exterior e de órgãos competentes, como a anuência aduaneira da Receita Federal no Sistema Integrado de Comércio Exterior (Siscomex) e a anuência não aduaneira, de Direito Regulatório, no mesmo sistema, por entes como a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o Comando do Exército, a Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), o Departamento de Polícia Federal (DPF), o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) e outros, nas importações, bem como as autorizações e validações pelo Conselho Federal de Engenharia e Agronomia (Confea) na área de obras e serviços de engenharia, com brasileiros ou estrangeiros; e

3) Apresentação de “documentos equivalentes”, ou seja, aqueles que embora tenham alguma diferença de nomenclatura ou características, servem para mesma finalidade, como os balanços contábeis, ainda que com diferentes datas de fechamento, o número de identificador fiscal, ainda que único em outros países, quando no Brasil são três diferentes, pelas esferas federal, estatual/distrital e municipal.

Com tais considerações, já se percebe que equivalentes não são documentos como interpretados segundo entendimento pessoal de cada interessado, mas de análise precisa do que representa cada documento e sua regulação em território brasileiro.

Na hipótese efetiva de inexistir um documento estrangeiro com equivalência, como certidão de regularidade perante o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), certidão negativa de falência e outras, haverá a necessidade de declaração pelo representante legal da licitante estrangeira em modelo próprio constante de anexo do edital da licitação.

Mas não se pode desprezar o Direito Relatório, por exemplo, pretendendo ofertar, para futura importação, um produto não regularizado perante a Anvisa, a menos que aquele ente de regulação, por normatização específica, estabeleça certas condições para aceitabilidade de documentos estrangeiros “equivalentes”, de determinadas agências “congêneres”, de outros países, ou seja, com respeito à regulação, à legalidade, mesmo por exceções baseadas em permissões específicas de lei do respectivo setor regulado, como o médico hospitalar, o de telecomunicações, o de aviação civil e outros.

As conclusões demonstram um claro limiar para identificação do que seria equivalente, como se exemplifica do documento denominado past performance statement, um tipo de “declaração de desempenho passado”, bem como do documento denominado qualification testimonial ou “testemunho de qualificação”, ambos documentos emitidos pelos clientes de cada licitante e que servem como equivalentes de atestados de capacidade técnica, pelo conteúdo com informações de produtos, modelos, quantidades e registros de execução contratual em conformidade com o ajustado, ao contrário de simples “autodeclaração”, que não possui autorização na lei brasileira para substituir atestado.

Já no contexto da não equivalência estão situações nas quais se tenta forçar, por exemplo, a aceitação de registro de produto controlado por agência de regulação de outro país, sob normas próprias, para importação sem aprovação de agência de regulação brasileira ou sem que esta tenha editado exceções com base em permissão legal, até porque assim funciona em todos os países, para aceitação de documentos de entes de regulação estrangeiros, o que pode ocorrer, inclusive, sob acordos ou protocolos internacionais de cooperação.

Toda essa parte regulatória nas licitações é essencial, pois o Decreto nº 6.759/2009, que trata do “regulamento aduaneiro”, estabelece em seu artigo 550 que “a importação de mercadoria está sujeita, na forma da legislação específica, a licenciamento, por meio do Siscomex”, enquanto o seu parágrafo primeiro prevê que “a manifestação de outros órgãos, a cujo controle a mercadoria importada estiver sujeita, também ocorrerá por meio do Siscomex”, ou seja, não existe licitação internacional sem considerar como funciona o comércio exterior.

Em síntese, se órgãos da Administração direta e indireta, que atuam como anuentes no comércio exterior, são credenciados no Siscomex para pronunciamento acerca das operações relativas a produtos de sua área de competência, quando previsto em legislação específica, não há como tratar documentos estrangeiros como equivalentes sem considerar tal realidade.

Também as questões de regulações profissionais, como de engenheiro, arquiteto e outras, que possuem bases em leis específicas, para obras e serviços, não podem ser desconsideradas nos editais de licitações, pois a equivalência depende da análise pelos respectivos conselhos profissionais (engenheiro estrangeiro tem análise de sua formação antes de receber autorização para execução de trabalhos no Brasil, como também ocorre nos outros países).

Por tais razões, documentos que somente podem ser emitidos no Brasil, por órgãos competentes de fiscalização e controle em território nacional, não admitem equivalência, por envolverem legislação local de controle sobre produtos e serviços com reflexos em vida, saúde, segurança de pessoas, responsabilidades e outras repercussões, sendo as eventuais exceções expressamente estabelecidas.

E ainda que o artigo 9º, inciso II, da Lei nº 14.133/2021 estabeleça vedação ao tratamento diferenciado de natureza comercial, legal, trabalhista, previdenciária ou qualquer outra entre empresas brasileiras e estrangeiras, nos demais países a parte regulatória e de comércio exterior e de regulação profissional funciona com bases similares, com normas locais e suas exceções.

Esse cenário revela a necessidade de que, no futuro breve, o Brasil compreenda o que precisa ajustar em sua legislação local para perfeito enquadramento no Agreement on Government Procurement (GPA), o Acordo de Compras Públicas da Organização Mundial do Comércio (OMC), uma vez que este acordo abre a possibilidade de participação de empresas estrangeiras nas licitações “nacionais” ou “locais”, o que demandará revisão do Direito Regulatório brasileiro.

Por enquanto, nas licitações internacionais, agentes públicos e licitantes precisam compreender, claramente, o sentido das expressões “órgãos competentes” e “documentos equivalentes”, tendo como base cada legislação específica e suas particularidades.

(Fonte: Conjur)

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