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TCE aponta indícios de que prefeitura de São Leopoldo teria direcionado licitação para fornecedora de telas interativas


Município teria desclassificado de forma indevida a vencedora do certame e fechado a compra de 303 aparelhos de empresa que não obedeceria a um item do edital

Relatório do setor de auditoria do Tribunal de Contas do Estado (TCE) aponta que o pregão eletrônico da prefeitura de São Leopoldo para a aquisição de telas interativas para as escolas municipais foi supostamente direcionado em favor da empresa Smart Tecnologia em Comunicações. O documento é deste mês e tem acesso público na tramitação processual.

A concorrência foi realizada no segundo semestre do ano passado no município do Vale do Sinos, administrado por Ary Vanazzi. O valor unitário dos aparelhos ficou definido em R$ 32 mil. São Leopoldo adquiriu 303 deles, ao custo total de R$ 9,6 milhões. A tela interativa é uma espécie de lousa digital, com funcionalidades de toque na superfície para interação e acesso à internet via wi-fi e cabo de rede, além de ter aplicativos para a realização de atividades de ensino.

O relatório aponta dois aspectos principais para a conclusão do suposto direcionamento. Um deles trata de uma das exigências do edital de licitação da cidade do Vale do Sinos: foi listado que as telas interativas deveriam ter GPS integrado. A finalidade disso seria garantir monitoramento e localização em caso de furto. A prefeitura registrou que a solução fornecida pela Smart obedecia a regras do edital. Contudo, diz a auditoria do TCE, as telas interativas fornecidas pela empresa, sediada em Lajeado, não continham o GPS integrado.

A prefeitura de São Leopoldo começou a fazer desembolsos para pagar a Smart no final de janeiro de 2023. Somente em 14 de junho, meio ano depois, a auditoria verificou que a Smart emitiu nota fiscal para fazer a remessa de 400 aparelhos rastreadores da marca BWS, do modelo E3+, à prefeitura. Conforme às especificações técnicas, o rastreador possui “antena interna GPS”.

Em vistoria presencial em 4 de julho, a auditoria do TCE localizou centenas desses equipamentos encaixotados em um depósito. Servidores municipais justificaram que eles ainda teriam de ser instalados pela Smart na carcaça das telas, na parte interna.

“As telas interativas fornecidas pela empresa Smart Tecnologia não possuem o GPS integrado”, diz trecho do relatório de auditoria. A conclusão foi de que as telas, por não terem sido entregues com os rastreadores instalados, “não atendem” aos requisitos do edital, embora tenham recebido uma validação de conformidade junto à prefeitura. Ainda hoje, as telas compradas por São Leopoldo estão sem o monitoramento para o caso de furto.

A Smart Tecnologia contesta as conclusões da auditoria. A empresa diz que todas as telas interativas foram entregues com a “espera” para o funcionamento do GPS, mas que a operação deste serviço não era prevista no edital (leia nota na íntegra abaixo). Para que esteja operante, afirma a empresa, é necessário que a prefeitura contrate e pague uma prestadora de serviço de rastreamento que irá fornecer chips. Esses transmissores, semelhantes aos de um celular, podem ser acoplados diretamente à espera das telas, diz a empresa.

Questionada, a Smart afirma que o GPS pode funcionar somente com o encaixe do chip contratado, independentemente do rastreador remetido posteriormente em caixas. Conforme a Smart, o envio dos aparelhos E3+ é um adicional oferecido para baratear a contratação do serviço de rastreio.

O segundo item do possível direcionamento da licitação diz respeito à certificação da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) para as telas interativas. A auditoria incluiu no relatório uma manifestação da própria Anatel, na qual a agência afirma que a tela interativa não necessita de homologação como produto final. “Basta seus módulos de comunicação sem fio estarem homologados”, diz trecho do esclarecimento da Anatel.

A auditoria avaliou que uma das empresas concorrentes no pregão de São Leopoldo e que seria a vencedora por cobrar R$ 100 a menos por tela, a B2G Comércio de Produtos e Equipamentos, apresentou certificação suficiente da Anatel para os “módulos de comunicação sem fio”. Contudo, a auditoria destacou que ela foi desclassificada pela prefeitura por não ter a homologação do equipamento tela interativa. Como a Anatel informou que a certificação para o produto final não é obrigatória, o relatório apontou que sua exigência e a desclassificação foram “indevidas”.

“Tais inconformidades macularam o andamento do processo licitatório, com favorecimento à empresa Smart Tecnologia em Comunicações pela desclassificação indevida da vencedora da licitação”. O relatório ainda apontou a “constatação de verossímeis indícios de direcionamento e favorecimento”.

A Smart rebate as avaliações da auditoria do TCE. A empresa afirma que a sua concorrente apresentou a certificação de somente um dos três módulos que exigiam o selo da Anatel. Além disso, diz a Smart, a certificação apresentada pela adversária era relacionada a outro modelo de tela interativa. Por isso, assegura, era um atestado inválido, o que teria justificado a desclassificação.

Eventual prejuízo aos cofres públicos

A auditoria do TCE solicitou que o procedimento seja transformado em um processo de contas especiais, para verificação de eventual prejuízo aos cofres públicos e busca por ressarcimento. A solicitação ainda depende de análise e autorização do conselheiro-relator Estilac Xavier.

Os relatórios produzidos pelo setor de auditoria não significam condenação. Eles costumam servir de base para que o Ministério Público de Contas (MPC) emita pareceres requisitando arquivamentos de casos ou a aplicação de penalidades a gestores públicos que eventualmente cometerem irregularidades. Os documentos também podem embasar pedidos cautelares (liminares) para a paralisação de pagamentos ou suspensão de uma licitação, por exemplo.

No final do processo, cabe aos sete conselheiros do TCE fazer a análise de mérito para decidir se acatam ou não os apontamentos e pedidos de penalidades do setor de auditoria e do MPC.

Outras prefeituras

Em dezembro de 2022, a Secretaria Municipal de Educação de Porto Alegre (Smed) aderiu à ata de registro de preço de São Leopoldo, procedimento conhecido como carona por acelerar o gasto público, para comprar 188 telas com preço final de R$ 6 milhões.

Além de São Leopoldo, tramitam no TCE processos de análise de aquisições de telas interativas junto à Smart pelas prefeituras de Porto Alegre, Cachoeirinha e Gravataí. Nos casos de Porto Alegre e Cachoeirinha, o conselheiro-relator Renato Azeredo arquivou os pedidos cautelares de obstrução dos contratos por entender que não era possível “concluir de forma inequívoca” a existência de alegado sobrepreço.

Ele ainda determinou que as compras de telas pelas duas cidades fossem analisadas em um processo de contas especiais para a verificação de demais irregularidades e eventuais responsáveis.

De forma geral, as telas interativas compradas pelos municípios estão instaladas e em uso rotineiro nas salas de aula.

Contraponto

O que diz a Superintendência de Comunicação da prefeitura de São Leopoldo

A prefeitura de São Leopoldo informa que não foi comunicada do referido relatório de auditoria do TCE, com relação ao Pregão Eletrônico vencido pela Smart Tecnologia, conforme mencionado e questionado pela reportagem.

No entanto, desde já frisamos que acreditamos na transparência e lisura de todo o processo e nos colocamos à disposição, caso o município seja demandado formalmente para prestar os esclarecimentos que se fizerem necessários.

O que diz a Smart Tecnologia em Comunicações

Preliminarmente, informa-se que, até a presente data, a Smart Tecnologia não foi cientificada da existência de relatório de auditoria relativo ao pregão eletrônico nº 047/2022, realizado pelo município de São Leopoldo, e tampouco intimada a se manifestar junto ao TCE/RS.

1 – A homologação junto à Anatel é exigência legal para a comercialização no Brasil de produtos que tenham módulos de Radiação Restrita abarcados e, no caso de a homologação apresentada for individualizada por módulos, estes devem estar sob a classificação “Transceptores de Radiação Restrita” na Lista de Referência dos Produtos, ou seja, o certificado deve indicar a qual “produto final” o módulo está habilitado.

A Tela Interativa é composta por três módulos, sendo um de Wi-Fi vinculado ao Android e dois módulos vinculados ao sistema Windows, um para Wi-Fi e outro para Bluetooth.

A empresa B2G Comércio, na tentativa de comprovar que seu equipamento atendia às especificações do edital, apresentou apenas um certificado de homologação sob nº 00711-22-06714, cuja incorporação em outro equipamento requer nova avaliação. Ou seja, o certificado apresentado é de apenas um de três módulos que devem estar na tela interativa e, ainda por cima, refere-se a produto totalmente estranho à marca/modelo de tela por eles cotado, sendo este o motivo que levou a sua desclassificação.

2 – A respeito da funcionalidade GPS integrada à tela interativa, informamos que a Smed de São Leopoldo, após inspeção pela auditoria do TCE/RS, emitiu a notificação nº 11/2023 questionando a respeito da funcionalidade.

Segundo informava na notificação, o Serviço de Auditoria, sem realizar qualquer inspeção ou teste da funcionalidade na tela interativa, afirmava que o conteúdo de quatro caixas enviadas pela Smart Tecnologia à SMED seriam os dispositivos de GPS que deveriam estar abarcados nas telas interativas.

Primeiramente, cabe esclarecer que os equipamentos entregues ao município de São Leopoldo, do modelo SmartBoard4K HM75, estão todos em consonância ao que determinou o termo de referência do edital de pregão eletrônico nº 47/2022, tanto quanto a hardware, como a software e certificações.

A funcionalidade do GPS é formada por duas partes que são dependentes entre si. A primeira parte é a funcionalidade do GPS quanto à ‘espera’ do dispositivo e que vem abarcada no equipamento. A segunda parte é formada pelo dispositivo de rastreio que é relacionada ao serviço de rastreio/monitoramento do dispositivo, o que não está previsto nas especificações do edital de licitação. O serviço de rastreio/monitoramento relacionado não está inserido nesta contratação, sendo de obrigação da municipalidade a contratação.

Salienta-se que qualquer instalação que se faça necessária será executada pela Smart Tecnologia sem qualquer custo adicional ao município de São Leopoldo.

(Fonte: Gauchazh)

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