O governo do Paraná, por meio da Amep (Agência de Assuntos Metropolitanos do Paraná), promete lançar neste primeiro semestre um edital de licitação para o transporte coletivo da Região Metropolitana de Curitiba (RMC). Com isso, a expectativa é de que no início de 2025 os novos contratos estejam assinados e operando.
A realização do processo pode dar fim a um imbróglio de décadas, que envolve uma ação promovida pelo Ministério Público do Paraná (MP-PR) e determinações do Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR).
Qual é o cronograma para a licitação do transporte coletivo?
A primeira versão do edital foi submetida a uma consulta pública no final do ano passado. O governo recebeu 181 contribuições, que estão sendo analisadas. O diretor-presidente da Amep, Gilson Santos, afirma que o órgão deve formular respostas a todas elas até o final de janeiro.
A maior parte, segundo ele, é de pedidos dos próprios usuários do transporte coletivo, que demandam novas linhas, horários ou mais integração. Empresas do setor também fizeram contribuições, tratando, por exemplo, da padronização dos veículos. A Amep promete tornar públicas todas as sugestões e as respostas no site oficial.
Após essa etapa, o edital precisa passar pela análise da Procuradoria Geral do Estado do Paraná (PGE-PR) e da Agência Reguladora de Serviços Públicos Delegados do Paraná (Agepar). A última fase antes do lançamento do edital é a realização de uma audiência pública. De acordo com Santos, a previsão é de que o evento aconteça na primeira quinzena de abril.
“A partir do momento que lançamos o edital ficamos vulneráveis a recursos, à judicialização do processo. Mas estamos otimistas em relação ao trabalho que foi realizado”, diz o presidente da Amep.
O que está no edital
O documento submetido à consulta pública foi elaborado com base em estudos realizados pela Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas) e pela Fepese (Fundação de Estudos e Pesquisas Socioeconômicas) em parceria com o LabTrans da UFSC (Laboratório de Transporte e Logística da Universidade Federal de Santa Catarina).
Estudos da Fipe também embasaram o edital de licitação do transporte coletivo em Cascavel (PR). Lançado em dezembro do ano passado, o processo não teve interessados.
O modelo da concorrência proposto pela Amep para a RMC é o de menor tarifa. Os municípios foram divididos em quatro lotes, de acordo com o critério de proximidade geográfica:
Lote 1: Almirante Tamandaré, Balsa Nova, Campo Largo, Campo Magro, Cerro Azul, Doutor Ulysses, Itaperuçu e Rio Branco do Sul.
Lote 2: Adrianópolis, Bocaiúva do Sul, Campina Grande do Sul, Colombo, Quatro Barras e Tunas do Paraná.
Lote 3: Tijucas do Sul, Piraquara, Pinhais e São José dos Pinhais.
Lote 4: Agudos do Sul, Araucária, Campo do Tenente, Contenda, Fazenda Rio Grande, Lapa, Mandirituba, Piên, Rio Negro e Quitandinha.
O prazo da concessão, segundo a proposta inicial, é de 12 anos. O valor total da licitação é de R$ 6,1 bilhões. O lote 3 é o que tem o maior valor estimado do contrato, de R$ 1,64 bilhão. No lote 1, a projeção é de R$ 1,60 bilhão, enquanto para os lotes 2 e 4 a estimativa é de R$ 1,41 bilhão e de R$ 1,47 bilhão, respectivamente.
Segundo o edital, a empresa ou o consórcio vencedor em cada lote terá de iniciar a operação com veículos novos em 100% da frota. Em todo o período da concessão, a idade média dos veículos não pode superar sete anos.
Também há a previsão de interoperabilidade do sistema de bilhetagem – ou seja, os usuários poderão usar o mesmo cartão de transporte para pagar a passagem em todos os municípios. Há exigência, ainda, de tecnologia para pagamento com cartão de débito e crédito, além de Pix.
O presidente do Sindimoc (Sindicato dos Motoristas e Cobradores de Ônibus de Curitiba e Região Metropolitana), Anderson Teixeira, diz que a entidade pediu à Amep que os trabalhadores que já atuam no sistema tenham preferência nas contratações após a licitação. “O governo tem se mostrado aberto ao diálogo. Agora temos que aguardar para ver se de fato vão ouvir as nossas contribuições”, afirma.
Até o lançamento do processo, a Amep pode mudar o que está previsto no edital.
A tarifa pode baixar?
Os documentos iniciais da licitação estimam um valor de tarifa técnica para cada um dos lotes. Essa tarifa é o custo do transporte dividido pelo número de passageiros pagantes.
Na RMC, a tarifa técnica média está em R$ 9,28, segundo Santos. No primeiro anel, que inclui as cidades mais próximas à capital, o usuário paga um valor menor, de R$ 4,75 no cartão e R$ 5,50 no dinheiro. A diferença é bancada por um subsídio: considerando toda a RMC, R$ 17 milhões por mês são desembolsados pelo governo do estado para diminuir o valor da passagem.
Os cálculos disponibilizados na consulta pública preveem uma tarifa técnica de R$ 10,49 para o lote 1; de R$ 12,10 para o lote 2; de R$ 12,55 para o lote 3; e de R$ 10,30 para o lote 4.
Segundo o presidente da Amep, não é possível dizer se a tarifa para o usuário irá aumentar, ou não, após a licitação. “Apostamos que, com uma boa concorrência, poderemos ter um custo menor ao que é praticado hoje e, com isso, o governo poderá diminuir o valor do aporte. Baixar ou não a tarifa [aumentando o subsídio] será uma decisão política”, diz.
Governo é cobrado para fazer a licitação do transporte desde 2015
Os contratos que regem a prestação do serviço por 18 empresas na RMC datam dos anos 1970. O prazo de vigência inicial era de dez anos, mas os instrumentos foram sendo prorrogados desde então. Em 2010, a operação do transporte coletivo de Curitiba passou por uma licitação. A concorrência pelo lote que incluía os municípios da RMC, porém, acabou não acontecendo.
Cinco anos depois, no governo de Beto Richa (PSDB), o MP-PR emitiu recomendações para que a antiga Comec (Coordenação da Região Metropolitana de Curitiba), hoje Amep, realizasse a licitação. À época, o governador Ratinho Junior (PSD) era secretário do Desenvolvimento Urbano do estado.
Em 2021, porém, o órgão entrou na Justiça afirmando que as recomendações não haviam sido atendidas e pedindo que o governo terminasse os estudos necessários para, enfim, realizar o processo.
Também na gestão de Beto Richa,em 2013, a antiga Comec chegou a contratar a Fipe para a realização dos estudos. Mesmo assim, a licitação não foi adiante. Segundo o MP-PR, o governo tem conhecimento da necessidade da licitação há “longa data”, e é “inadmissível” que o transporte da RMC “opere de forma tão precária”.
No âmbito dessa ação, em 20 de janeiro de 2021, o juiz Roger de Camargo Oliveira, da 3ª Vara da Fazenda Pública de Curitiba, determinou em liminar um prazo de nove meses para que o Executivo fizesse a licitação. Seriam seis meses para a complementação dos estudos e mais três para que o processo fosse de fato realizado.
O governo recorreu e, em 22 de março de 2021, o Tribunal de Justiça determinou que o prazo fosse ampliado para dois anos. A nova data foi definida com base em uma tomada de contas extraordinária realizada pelo TCE-PR.
Pedido de multa
Em abril de 2023, quando o prazo havia expirado sem a realização do processo, o MP-PR pediu que o presidente da Amep fosse multado em R$ 50 mil diários enquanto a licitação não fosse realizada.
“Ao longo de todos esses anos, o Ministério Público tentou por inúmeras vezes celebrar termos de ajustamento de conduta com a Comec, já que todos os estudos realizados pela Fipe estavam prontos para a realização do processo licitatório. Contudo, não obtiveram êxito, não restando alternativa senão o ajuizamento da presente ação”, escreveram os promotores Ivan Barbosa Mendes e Alexandre Gaio.
O juiz Roger Oliveira, porém, decidiu não aplicar a multa, já que o processo no TCE-PR ainda não transitou em julgado. À reportagem da Gazeta do Povo, o presidente da Amep, Gilson Santos, afirmou que o órgão instituiu um grupo de trabalho para a realização do edital em 2019. Segundo ele, a pandemia de Covid-19 atrasou o processo. “Seria irresponsável fazer uma licitação no momento em que o mundo vivia uma calamidade sanitária na qual o transporte foi um dos setores mais afetados”, disse. O grupo retomou as atividades em 2023.
(Fonte: Gazeta do Povo)