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Licitações desertas e fracassadas: Distinções e efeitos jurídicos

A licitação deserta e fracassada são institutos diversos e a contratação direta em decorrência dessas hipóteses requer o atendimento de uma série de exigências legais para o seu adequado enquadramento jurídico.

O comando constitucional contido no art. 37, inciso XXXI, prescreve que as obras, serviços, compras e alienações realizadas pela Administração Pública direta (União, Estados, do Distrito Federal e municípios) e indireta (autarquias, fundações públicas, empresas públicas e sociedades de economia mista) sejam precedidos de licitação.

A matéria é disciplinada em âmbito federal pela lei 8.666/93, que estabelece as normas gerais sobre licitações e contratos administrativos.

A licitação é um procedimento formal pela qual a Administração Pública busca selecionar a melhor proposta para contratação de bens, produtos ou serviços, consoante aponta Celso Antônio Bandeira de Mello:

Licitação – em suma síntese – é um certame que as entidades governamentais devem promover e no qual abrem disputa entre os interessados em com elas travar determinadas relações de conteúdo patrimonial, para escolher a proposta mais vantajosa às conveniências públicas. Estriba-se na ideia de competição, a ser travada isonomicamente entre os que preencham os atributos e aptidões necessárias ao bom cumprimento das obrigações que se propõem assumir (2013, p.532).

Conforme se observa da definição acima transcrita, a realização de qualquer licitação depende da existência de três pressupostos: i) lógico: diz respeito à existência de uma pluralidade de objetos, tal preceito está relacionado à análise, no plano abstrato, se o objeto é licitável ou de natureza singular; ii) jurídico: a licitação deve constituir meio apto para que a Administração possa cumprir ao interesse que deve prover e; iii) fático: a existência de uma pluralidade de interessados em disputar o certame (BANDEIRA DE MELLO, 2013, p. 550-551).

Entretanto, há casos em que a licitação não atinge um de seus pressupostos, seja por falta de competidores interessados em participar do certame, tornando-a deserta ou porque nenhum dos licitantes atenderam às condições dispostas no edital, restando desclassificados ou inabilitados, denominada licitação fracassada.

Observa-se que a licitação deserta e a fracassada atinge pressupostos diversos. Na licitação deserta não há pressuposto fático, enquanto na licitação fracassada falta-lhe pressuposto jurídico. Seguindo essa linha de raciocínio, tais quais os pressupostos, os efeitos jurídicos dessas licitações também são distintos.

Questão que costuma gerar polêmica é se a licitação deserta ou fracassada pode justificar uma contratação direta, ou seja, sem licitação.

Embora a contratação direta figure no campo discricionário da Administração, baseado na conveniência e oportunidade, sua adoção depende, em relação à licitação deserta, da avaliação dos motivos do não comparecimento de licitantes e da forma mais adequada para a contratação.

Assim, antes de avançar com a contratação direta, convém averiguar se não houve falha na elaboração do edital, pois nesse caso, não se cogita em dispensa de licitação, mas sim na realização de novo certame, sem os vícios que afastaram os possíveis interessados do certame anterior (VARESCHINI, 2013, p. 90-91).

A contratação direta, nessa hipótese, requer justificativa do gestor público que deve deixar demonstrado, de forma fundamentada, que a abertura de novo procedimento licitatório pode causar prejuízo à Administração e que sejam mantidas as condições já previstas no instrumento convocatório, nos termos do art. 24 da Lei de Licitações, que dispõe “quando não acudirem interessados à licitação anterior e esta, justificadamente, não puder ser repetida sem prejuízo para a Administração, mantidas, neste caso, todas as condições preestabelecidas” (BRASIL, 1993, s/p).

Nessas condições, o pleito, como em qualquer contratação direta, também requer o emprego de um procedimento formal, compreendendo a justificativa do preço, a ratificação do ato pela autoridade superior e a publicação do ato que autorizou a contratação direta na imprensa oficial, nos termos do art. 26 da lei 8.666/93.

Ademais, o contratado deverá possuir todas as condições de habilitação exigidas para a licitação, a saber: qualificação técnica e econômico-financeira, habilitação jurídica, regularidade fiscal e trabalhista, bem como idoneidade, visto que é vedado ao Poder Público celebrar contratos com empresas declaradas inidôneas ou que estão temporariamente suspensas do direito de licitar e contratar.

Já na hipótese de licitação fracassada a contratação direta, via de regra, não é autorizada, devendo, o Poder Público conceder prazo de oito dias úteis, ou três dias úteis nos casos de convite, para a apresentação de nova documentação ou de outras propostas, segundo dispõe o art. 48, §3º do estatuto licitatório.

Com efeito, pode-se afirmar que licitação deserta e fracassada não se confundem e geram reflexos diferentes no âmbito das licitações e contratações públicas, conforme defende a Prof. Maria Sylvia Zanella Di Pietro:

A licitação deserta não se confunde com a licitação fracassada, em que aparecem interessados, mas nenhum é selecionado, em decorrência da inabilitação ou da desclassificação. Neste caso, a dispensa de licitação não é possível (2003, p. 314).

Assim, comumente, não se permite a contratação direta em licitações fracassadas, salvo na condição expressa no art. 24, VII, da Lei de Licitações que assim dispõe:

VII – quando as propostas apresentadas consignarem preços manifestamente superiores aos praticados no mercado nacional, ou forem incompatíveis com os fixados pelos órgãos oficiais competentes, casos em que, observado o parágrafo único do art. 48 desta Lei e, persistindo a situação, será admitida a adjudicação direta dos bens ou serviços, por valor não superior ao constante do registro de preços, ou dos serviços (BRASIL, 1993, s/p).

Ressalte-se que a lei apenas admite a contratação direta nos casos de licitação fracassada em função do valor excessivo das propostas, não possibilitando a utilização desse permissivo legal aos demais casos de inabilitação ou desclassificação de propostas. Além disso, deverão ser atendidos e evidenciados no processo de contratação os seguintes requisitos: a) que houve a realização de uma licitação anteriormente à contratação direta; b) que a Administração exerceu a faculdade de reapresentação das propostas, prevista no art. 48, § 3º da lei 8.666/93 e; c) a existência de interessado disposto em contratar por valor compatível ao mercado, baseado em pesquisa de preços (VARESCHINI, 2013, p.94-95).

Destaca-se, ainda, que a dispensa de licitação não tem fundamento nos casos em que o certame foi processado na modalidade convite, segundo orientação normativa 12/09 da Controladoria Geral da União (CGU).

Da análise das situações fáticas acima apontadas, verifica-se que o ambiente dos negócios públicos é cercado de grande complexidade e exige cada vez mais uma atuação técnica e especializada do gestor, lastreada por um alto conhecimento do aparato legal vigente e das recomendações dos órgãos de controle externo.

A despeito do tema em debate ser corriqueiro, não raramente depara-se com situações em que a Administração Pública atribui às licitações deserta e fracassada igual tratamento, contratando de forma direta, situação caracterizada como licitação fracassada, em que a lei não autoriza a dispensa da licitação ou, ainda, deixa de adotar os procedimentos formais adequados nos casos que permitem a dispensa de licitação, o que pode culminar na tríplice responsabilização (administrativa, cível e criminal) do agente público.

(Fonte: Uol_Migalhas)

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