Notícias

STJ: Lei 14.133/21 suprimiu singularidade na contratação de notório especializado

No dia 22 de abril de 2021, tive a oportunidade de publicar nesta coluna um texto (“The Walking Dead na Administração Pública: temporada final”) [1] em que sustentei que a Lei 14.133/21 (nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos), a exemplo da Lei 13.303/16 (Estatuto Jurídico das Empresas Estatais), tinha eliminado do contexto das contratações diretas de notórios especializados, via da inexigibilidade de licitação, o requisito da singularidade do objeto, porquanto o vocábulo “serviço de caráter singular” (que consta do artigo 25, II da Lei 8.666/93) simplesmente não havia sido reproduzido na disciplina do artigo 74, III, da Lei 14.133/21.

A posição contraditava a opinião de juristas de nomeada que se dedicaram ao estudo do tema, tanto na Lei 13.303/16 [2] quanto na Lei 14.133/21 [3], assim como manifestação do Tribunal de Contas da União (TCU) sobre o Estatuto Jurídico das Empresas Estatais, que possui disposição semelhante (artigo 30, II) [4].

A discussão chegou recentemente ao Superior Tribunal de Justiça, que pela primeira vez, ainda que em âmbito criminal, debateu o tema, notadamente no julgamento do AgRg no HC 669.347/SP (relator ministro Jesuíno Rissato — desembargador convocado do TJ-DFT —, relator p/acórdão ministro João Otávio de Noronha, 5ª Turma, julgado em 13/12/2021, DJe 14/0/2022), concluindo que “conforme disposto no artigo 74, III, da Lei nº 14.133/2021 e no artigo 3º-A do Estatuto da Advocacia, o requisito da singularidade do serviço advocatício foi suprimido pelo legislador, devendo ser demonstrada a notória especialização do agente contratado e a natureza intelectual do trabalho a ser prestado” [5].

A fundamentação do voto vencedor do acórdão, da lavra do ministro João Otávio de Noronha, expõe que “com o advento da Lei nº 14.133/2021, nos termos do artigo 74, III, o requisito da singularidade do serviço advocatício deixou de ser previsto em lei, passando a ser exigida a demonstração da notória especialização e a natureza intelectual do trabalho. Essa interpretação, aliás, é reforçada pela inclusão do artigo 3º-A do Estatuto da Advocacia pela Lei nº 14.039/2020, segundo o qual ‘os serviços profissionais de advogado são, por sua natureza, técnicos e singulares, quando comprovada sua notória especialização, nos termos da lei’. Desse modo, considerando que o serviço de advocacia é por natureza intelectual e singular, uma vez demonstrada a notória especialização e a necessidade do ente público, será possível a contratação direta” [6].

É interessante notar que o relator do caso versado, o ministro João Otávio Noronha, foi também relator, no passado, de dois acórdãos da 2ª Turma do STJ (nos anos de 2005 e 2008) que tratavam dos requisitos para a contratação direta prevista no artigo 25, II, da Lei 8.666/93, entre eles o da natureza singular dos serviços [7]. Tais acórdãos podem ser considerados leading cases a propósito do assunto, porquanto reproduzidos como fundamento em grande parte dos julgados posteriores [8].

Com efeito, no julgamento do REsp 436.869/SP (relator ministro João Otávio de Noronha, 2ª Turma, julgado em 6/12/2005, DJ 01/02/2006, p. 477) o tribunal considerou que “os serviços descritos no artigo 13 da Lei nº 8.666/93, para que sejam contratados sem licitação, devem ter natureza singular e ser prestados por profissional notoriamente especializado, cuja escolha está adstrita à discricionariedade administrativa”, de igual modo, o REsp 488.842/SP (relator ministro João Otávio de Noronha, relator p/acórdão ministro Castro Meira, 2ª Turma, julgado em 17/4/2008, DJe 05/12/2008), onde está registrado que “a contratação dos serviços descritos no artigo 13 da Lei 8.666/93 sem licitação pressupõe que sejam de natureza singular, com profissionais de notória especialização”.

Como se vê, a nova decisão do STJ revisita a própria jurisprudência da corte acerca dos requisitos inerentes à contratação direta de notórios especializados pela Administração Pública, em respeito à opção feita pelo legislador democrático. Nesse sentido, uma vez presente e justificada a necessidade administrativa subjacente [9] (que deve ser avaliada em juízo de proporcionalidade [10], considerados os obstáculos e as dificuldades reais do gestor — artigo 22 da LINDB) e o preço [11], a notoriedade do contratado é o fator distintivo que suportará a legitimidade da contratação.

Carlos Maximiliano diria que “a lei não contém palavras inúteis” [12]… O silêncio deliberado do legislador não se acredita possa ser interpretado com a tela mais famosa de Edvard Munch.

(Fonte: Conjur)

Related posts
Notícias

SERVIDORES E COLABORADORES DA SEMACE SÃO CAPACITADOS SOBRE NOVA LEI DE LICITAÇÕES

Para acompanhar as mudanças na Lei de Licitações, a Superintendência Estadual do Meio Ambiente…
Read more
Notícias

Chapadão do Sul abre licitação para contratação de fretamento de ônibus em secretarias

O credenciamento e o recebimento das propostas ocorrerão no dia 3 de junho de 2024 O município de…
Read more
Notícias

Após suspender licitação para via expressa dentro de parque, governo do Pará diz que vai readequar projeto

Prolongamento da Rua da Marinha tinha sido apresentado em fevereiro de 2024 e cortava o parque…
Read more

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *