Notícias

Por que o Brasil gasta mais de R$ 420 mi por ano com Superior Tribunal Militar em tempos de paz

As forças Armadas do Brasil contam com cerca de 350 mil militares na ativa e uma justiça especializada que funciona há 208 anos e vai consumir R$ 430 milhões dos cofres públicos este ano.

Somente o Superior Tribunal Militar (STM), a mais alta corte responsável por julgar recursos de crimes previstos no Código Penal Militar e oficiais generais das Forças Armadas, tem 15 ministros e orçamento de R$ 419,5 milhões para 2016.

Se comparado com o Supremo Tribunal Federal, que custa R$ 554,7 milhões por ano, o STM tem quatro ministros a mais, orçamento 25% menor e uma produtividade atípica para os padrões do açodado e moroso judiciário brasileiro.

Enquanto a corte militar julga, em média, 1.200 processos por ano, o Supremo dá cerca de 8 mil decisões por mês. Os ministros do STM levam, em média, oito meses para dar uma sentença. No STF, ações penais demoram cerca de cinco anos e meio para chegar a uma decisão final, conforme levamento do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

Mas por que o Brasil, mesmo em tempos de paz, mantém uma justiça especializada em julgar crimes cometidos contra as Forças Armadas e por seus representantes?

Custo e benefício

“Estamos tratando de segurança e defesa. São em sua maioria situações especiais. A justiça militar tem que ser rigorosa e severa e, quando se trata de militar, é razoável que eles sejam julgados por seus próprios pares”, defende Maria Elizabeth Teixeira Rocha, ministra do STM e ex-presidente da corte militar.

Ela pondera que uma jurisdição não pode ser medida apenas por quanto custa por ano. Afirma ainda que o problema não é o STM julgar poucos processos, mas as outras cortes estarem tão assoberbadas.

“A Justiça militar é uma Justiça pobre. Não consigo ver essa desproporcionalidade como falam”, observa Rocha.

Cerca de 85% do orçamento de 2016 aprovado para o STM está comprometido com pagamento de pessoal e encargos sociais. Dos R$ 355,5 milhões reservados para o fim deste ano, 49% serão gastos com aposentados e pensionistas, conforme dados do STM.

Para a cientista política Maria Celina D’Araújo, professora da PUC-Rio, a existência dessa estrutura em tempos de paz é um forte indicativo do prestígio que os militares desfrutam na sociedade brasileira.

“É um custo benefício que não vale a pena. Não faz sentido, é uma estrutura cara e pesada demais”, avalia a professora.

Tradição
A Justiça Militar da União é a mais antiga do país. Foi instituída em 1808, pouco depois de Dom João desembarcar no Brasil. A partir de 1934, deixou de ser um braço do Executivo e passou a fazer parte do Poder Judiciário.

Suas principais atribuições foram alteradas pela Constituição de 1988 e por uma lei assinada pelo então presidente Fernando Collor em 1992.

Tem duas instâncias: 20 auditorias militares e uma auditoria de correição; e o STM como corte superior. Julga apenas atos relacionados às normas, ao patrimônio e administração da Aeronáutica, Exército e Marinha, e crimes cometidos por civis contra as Forças Armadas, em áreas sob seu comando ou contra seus representantes em serviço.

Crimes cometidos pela Polícia Militar não são analisados por essa estrutura do Judiciário federal. Eles são julgados pela Justiça estadual – apenas Minas Gerais, Rio Grande do Sul e São Paulo ainda mantêm cortes especializadas para policiais e bombeiros militares.

Um levantamento inédito feito pelo STM identificou que casos de uso, tráfico e porte de drogas nas Forças Armadas aumentaram 300% em dez anos. Cerca de 95% dos flagrados são jovens soldados temporários e recrutas de 18 anos.

Os crimes de deserção (abandono da Força), estelionato – em sua maioria golpes aplicados por civis na tentativa de fraudar a Previdência militar – e furto respondem pela maioria dos processos, segundo o mesmo estudo.

“Muitos são crimes que poderiam facilmente ser julgados pela justiça comum, não são exclusivos da carreira militar. Além disso, muitas das infrações, como as de obediência, são tratadas na esfera administrativa, fazem parte da ‘justiça do comandante’ e são resolvidas dentro do próprio quartel”, salienta a professora Maria Celina D’Araújo, defensora de criar varas especializadas em crimes militares junto à Justiça estadual e federal.

Na primeira instância, os julgamentos acontecem nos conselhos permanentes, quando os réus são praças, e nos conselhos especiais, quando os réus são oficiais. Os conselhos são compostos por um juiz-auditor que não é militar e por quatro militares de patente superior à do réu.

O STM, por sua vez, tem entre seus ministros dez militares da ativa (três da Marinha, três da Aeronáutica e quatro do Exército do posto mais elevado da carreira) e cinco civis (sendo três advogados, um juiz-auditor e um membro do Ministério Público Militar).

Reestruturação
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) propôs mudanças na estrutura da Justiça militar da União, apontando que o custo médio dos processos é muito superior aos dos três Estados que ainda mantêm uma estrutura similar para seus policiais militares.

Estima-se que cada processo que tramita na primeira ou segunda instâncias da corte especializada para as três Forças Armadas custa R$ 155,6 mil. O CNJ também sugeriu redução, de 15 para 11, do número de ministros que compõem o STM.

“Há necessidade de se adequar a estrutura e equalizar a carga de trabalho da Justiça Militar àquela observada nos outros ramos da Justiça”, diz o relatório concluído em dezembro de 2014.

A ministra Maria Elizabeth Teixeira Rocha rebate, dizendo que todas as determinações do CNJ são cumpridas “no que for possível”, como em termos de prazos e metas. Mas diz que muitas das atribuições da Justiça militar são constitucionais.

“Dependemos do Congresso. Estamos tentando uma reforma há dez anos. Eu sei que o Congresso não funciona em tempo real, só legisla quando pressionado”, argumenta a ministra do STM, que é uma das três civis e única mulher da corte militar.

Rocha afirma que há um consenso entre os ministros do STM no sentido de absorver parte dos casos relacionados às Forças Armadas tradicionalmente julgados pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), como processos de remoção, transferência e processos administrativos disciplinares.

“Se a ideia é que Justiça boa é justiça assoberbada, acho mais razoável ampliar nossa competência. Pagamos por um anacronismo pelo qual não somos responsáveis”, reclama a ministra.

(Fonte: Terra)

Related posts
Notícias

Prefeitura de Palhoça abre licitação para contratar empresa de sistema de água e saneamento

A Prefeitura de Palhoça lança, nesta segunda-feira (6), uma licitação para contratar uma empresa…
Read more
Notícias

Petrobras abre licitação para retomar construção do antigo Comperj

Expectativa é gerar 10 mil empregos; Edital de licitação prevê a construção de planta para…
Read more
Notícias

Recife abre licitação para implantação de placas de rua em todas as vias da cidade

Foi publicado neste sábado (04) o edital de licitação para a concessão de serviços para…
Read more

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *