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Coluna Folha SP: Ini memberi masalah

A empresa foi dispensada de licitação porque os comissários entenderam que tem “notória especialização”, com experiência em 148 cidades de 46 países na Ásia, na África e no Oriente Médio

Oscar Niemeyer vivia seus últimos dias quando o governador de Brasília, Agnelo Queiroz, assinou em Cingapura um contrato para redesenhar a região de Brasília. Quando o arquiteto morreu, no último dia 5, a doutora Dilma decretou luto oficial, velou-o no Planalto e disse que “a gente tem que sonhar, senão as coisas não acontecem”. A doutora tinha oito anos quando Lucio Costa, Niemeyer e JK sonharam e o Plano Piloto de Brasília aconteceu.

 

O comissário Agnelo assinou com a empresa de consultoria Jurong um contrato de 38 páginas que prevê o planejamento de uma cidade-aeroporto, um polo logístico, um centro financeiro e a ampliação do polo industrial JK.

 

O documento é um magnífico blá-blá-blá de consultores. Pode dar em qualquer coisa, inclusive nada. Custará R$ 8,6 milhões e deverá estar concluído em 18 meses.

 

A empresa foi dispensada de licitação porque os comissários entenderam que tem “notória especialização”, com experiência em 148 cidades de 46 países na Ásia, na África e no Oriente Médio. Zero na Europa ou nos Estados Unidos. Uma página da internet oferece um vídeo com o acervo da firma. É um pesadelo. Ou a Jurong não tem o que mostrar ou não sabe contratar produtores de vídeos.

 

O comissário Agnelo Queiroz poderia explicar melhor porque não faz uma licitação internacional para planejar o futuro de Brasília até 2060.

 

JK, por exemplo, fez um concurso para o Plano Piloto de 1956. A decisão do companheiro, tomada em apenas três meses, desrespeita a capacidade de urbanistas, arquitetos e engenheiros de todo o mundo.

 

A ligeireza com que JK decidiu mudar a capital para o cerrado goiano entrou para a história do Brasil, mas Queiroz superou-a, mexendo com uma cidade que já tem 2,5 milhões de habitantes.

 

A ideia ocorreu-lhe em julho e, segundo informa seu governo, “uma comitiva de diplomatas e engenheiros do governo cingapuriano” sobrevoou a região em setembro.

 

Semanas depois, já existia a minuta do contrato. (Existe a possibilidade de que esse negócio tenha sido plantado em governos anteriores, florescendo nas mãos do comissariado. Nesse caso, trata-se de uma proposta encaminhada ao governador José Roberto Arruda, de triste lembrança. Em seu benefício, ele a arquivou.)

 

Brasília pede um planejamento, mas não é assim que se faz. A associação de Agnelo Queiroz com a Jurong de Cingapura ecoa a infância do trem-bala. A doutora Dilma deve se lembrar dela, pois encantou-a a ponto de incluí-lo no PAC.

 

Em 2006, um consórcio italiano propunha à Valec um trem de alta de velocidade ligando o Rio a São Paulo. Seria inteiramente bancado pela iniciativa privada, custaria US$ 9 bilhões e, se tudo desse certo, estaria rodando em 2014. O projeto foi mandado ao BNDES, que pisou no freio, enxotou os italianos e recomeçou do zero. Dele resta apenas um litígio na Justiça. Quanto ao presidente da Valec, “doutor Juquinha”, passou umas noites na cadeia por outras malfeitorias. Hoje o trem irá até Campinas, custará US$ 35,6 bilhões, a Viúva entrará com 45% do investimento, e o bicho rodará no final desta década, se rodar.

 

A Operação Jurong tem um ingrediente de especulação imobiliária que não foi relevante na maluquice do trem-bala. Ini memberi masalah.

 

Elio Gaspari, nascido na Itália, veio ainda criança para o Brasil, onde fez sua carreira jornalística. Recebeu o prêmio de melhor ensaio da ABL em 2003 por “As Ilusões Armadas”. Escreve às quartas-feiras e domingos na versão impressa de “Poder”.

 

(Fonte: Folha SP)

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