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CPI apontou problemas nos gastos com transporte público do DF; governo ‘fez pouco caso’, diz relator

A dificuldade do governo do Distrito Federal para “fechar a conta” dos serviços de transporte público foi evidenciada no relatório final da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investigou o tema na Câmara Legislativa, no primeiro semestre. Ao fim de um ano de audiências, o relatório de 219 páginas produzido pelos distritais apontava suspeitas de fraudes na licitação, concluída em 2011, repasses excessivos de dinheiro público às empresas e falta de fiscalização nas catracas. Passados oito meses do fim da comissão, os problemas não foram enfrentados.

“Ao invés de o governo aproveitar as sugestões da CPI do Transporte, ele ignora, faz pouco caso, como ignorou a decisão judicial que determinou o cancelamento dos contratos [com as companhias de ônibus], que são altamente lesivos à população”, afirma o relator da CPI, distrital Raimundo Ribeiro (PPS).

Em nota, a Secretaria de Mobilidade informou que reduziu repasses a três das empresas em julho, e disse que está “finalizando o processo de contratação de uma fundação para a realização de uma auditoria nos contratos”. O texto não informa prazo para esse pente-fino, que já tinha sido anunciado em agosto.

Nesta sexta (30), o governo anunciou que o preço das passagens de ônibus e metrô será reajustado a partir da próxima segunda (2), primeiro dia útil de 2017. Os valores vão passar de R$ 2,25 para R$ 2,50 nas linhas circulares e alimentadoras do BRT (aumento de 11%); R$ 3 para R$ 3,50 (aumento de 16%) em linhas metropolitanas “curtas”; e de R$ 4 para R$ 5 (aumento de 25%) no restante das linhas, além do metrô. As novas tarifas estão entre as mais caras do país.

Gratuidades

Entre as justificativas apresentadas pelo GDF para o aumento, está a necessidade de manter o custeio das gratuidades de deficientes e beneficiados pelo Passe Livre Estudantil. Em publicação no Facebook, o Palácio do Buriti afirma que “o porcentual pago pelo governo com passagens gratuitas é de 33%, enquanto a média nacional é de 15%.”

Ao analisar o tema, a CPI identificou um problema no valor desse repasse. Segundo o relatório, o governo do DF ressarce as empresas com base na tarifa técnica – o “valor real” da passagem de ônibus, que inclui o pagamento na catraca e o subsídio do governo. O ideal, segundo o relatório, era pagar esse benefício com base apenas na “tarifa usuário”, como é chamado o valor na catraca.

A conclusão se baseia num parecer do próprio governo, elaborado pela Procuradoria-Geral do DF após questionamento da Secretaria de Mobilidade. Nesta sexta, a pasta afirmou que, “após várias consultas no âmbito jurídico”, decidiu manter o pagamento baseado na tarifa técnica.

Segundo o relatório da CPI, em 2014 o GDF repassou R$ 37,9 milhões às empresas de ônibus para compensar as gratuidades. Em 2015, o valor passou para R$ 62,7 milhões – aumento de 65,36%.

A tarifa técnica varia de empresa para empresa. Em média, o “custo cheio” de cada passageiro em uma viagem de ônibus é de R$ 4,19 – valor abaixo dos R$ 5 que serão cobrados nas viagens de longa distância. A tarifa usuário tem valor médio de R$ 3,67, mas essa cifra tende a aumentar com o reajuste nas passagens.

Publicidade

Além de pagar muito às empresas, a CPI também apontou que o Palácio do Buriti pode estar falhando ao cobrar as contrapartidas que poderiam reforçar o caixa do governo e evitar novos aumentos.

Nos contratos de concessão das linhas de ônibus, está previsto que o GDF tem direito a 50% das verbas de exploração de publicidade interna e externa – propagandas afixadas na traseira dos veículos, ou que passam nas TVs instaladas em cada ônibus. Segundo a CPI, esse repasse não acontece.

“Apesar de ser notória a exploração de publicidade pelas operadoras, não houve qualquer repasse de receitas de publicidade à conta de compensação. Não se identifica, a princípio, qualquer dificuldade em obter essa receita, bastando apenas que seja apurado pelo DF o montante médio dos valores de citados contratos”, diz a CPI, sem citar valores médios.

“Até hoje, não há qualquer medida adotada pelo governo sobre essa arrecadação da publicidade nos ônibus. Quer dizer, o GDF diz que está em dificuldades financeiras, mas não vai buscar esse dinheiro que é direito”, diz Ribeiro.

Segundo a Secretaria de Mobilidade, o DFTrans realizou um “diagnóstico” dos processos de publicidade e recebeu R$ 806.945,00 relativos a essa contrapartida. Faltam, ainda, outros R$ 818.565,00, que não têm data prevista para serem depositados.

Na prática, o governo não tem “obrigação legal” de prestar contas à CPI sobre o atendimento às recomendações propostas no relatório. Apesar disso, segundo o relator da comissão, esse tipo de comunicação é usual nos governos, e compõe a harmonia da relação entre os poderes.

“A gente acreditava que o governo tinha a intenção de fazer as mudanças necessárias. Esperávamos que o governo atual fosse estancar essa saída de dinheiro público de modo irregular, mas não foi o que aconteceu. Esse reajuste é injustificável, porque a tarifa é paga por um serviço prestado. Quando aumenta, o raciocínio óbvio seria que vai melhorar o transporte, e não é o caso”, diz Ribeiro.

Licitação

O relatório da comissão parlamentar chega a sugerir a anulação total dos contratos com as empresas de ônibus, e a realização de uma nova concorrência. Segundo o texto, as medidas corretivas elencadas “não conseguem exaurir a necessidade de correção total do quadro dramático em que se situa o sistema de transporte público”.

Em janeiro, o juiz da 1ª Vara da Fazenda Pública Lizandro Gomes Filho chegou a anular a licitação, dando prazo de 180 dias para que o governo contrate novas empresas de ônibus. A decisão se baseia na suspeita de que o advogado Sacha Reck, que fez parte da comissão de licitação, atuou “ilicitamente na gestão e consultoria” do processo.

O governo recorreu da decisão judicial e mantém os mesmos contratos firmados em 2011. Reck nega as irregularidades, e diz ter provas de que o processo ocorreu de maneira legal. Ele é um dos citados no relatório da CPI, e teve o pedido de indiciamento protocolado pela comissão.

Fonte: G1

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