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Fragmentação da compra nas licitações

Gostaria de saber se uma prefeitura possui quatro fundos por exemplo FMS, FMDCA, FUNDEB e Executivo, todos com CNPJ diferentes e gestores diferentes, para mim contratar com eles, eu posso até 8.000,00 para cada fundo ou será 8.000,00 para todos.

Em regra a análise de fragmentação da compra para fuga de licitação, avalia as aquisições de determinado CNPJ ou unidade gestora. Sendo assim, cada unidade responderia de forma autônoma para cada uma das aquisições, a impedir, em tese, que houvesse o somatório dos valores para efeito da extrapolação do limite.

Mas é óbvio, que a análise é muito mais completa e depende de outros importantes fatores.

Por exemplo, se cada um dos fundos adquire o mesmo produto, para objetivos idênticos e, ainda por cima, fornecidos pela mesma empresa, haverá uma fundada suspeita de fraude ou, pelo menos, má gestão. Não é a classificação orçamentária que determina a adoção da modalidade licitatória ou da contratação direta por dispensa de licitação. É preciso analisar o objeto como um todo; o objetivo pretendido com a aquisição; a quantidade de fornecedores; a possibilidade da reunião das demandas em um procedimento único e mais amplo etc.

Isso porque a Prefeitura como, beneficiária última da ação das fundações, poderia estabelecer procedimento licitatório para aquisição conjunta, ou mesmo, poderia instaurar um registro de preços com cada uma das fundações a integrar o rol de “órgãos participantes”, sendo cada uma delas (fundações) responsável pela contratação com seu respectivo orçamento.

A propósito, a reunião das quantidades em um mesmo procedimento tende a aumentar a participação e disputa entre as empresas, a redundar na vantagem da obtenção da proposta mais vantajosa.

Sobre a classificação orçamentária, cumpre transcrever parte do ACÓRDÃO TCU Nº 1.620/2010 – PLENÁRIO:

“(…) 6. Essas obras e serviços de mesma natureza e no mesmo local poderiam ser realizadas conjunta e concomitantemente, em licitação na modalidade “convite”, em razão de seu somatório superar o valor limite de R$ 30.000,00 para a aludida dispensa. Justifica o responsável que as dispensas foram processadas em separado em virtude de os pagamentos feitos à contratada originarem-se de rubricas distintas, a saber: custeio para as duas primeiras e investimento para a última.

7. Como bem observou a Secex/RO, a classificação orçamentária das rubricas não determina a adoção dessa ou daquela modalidade de licitação, tratando-se de inequívoco fracionamento de despesa que impede a competição entre as empresas e consequentemente a possibilidade de escolha da proposta mais vantajosa para a Administração, objetivo dos certames licitatórios”. (Grifo acrescido)

Na esteira de avaliar o caso com cautela, o site do Ministério Público de Santa Catarina formulou denúncia e divulgou análise sobre um caso em que órgãos com CNPJs diferentes possam ter abusado do uso do instituto jurídico da dispensa de licitação:

“Para a Promotoria de Justiça, a análise dos procedimentos licitatórios não deixa dúvida sobre o cometimento dos atos de improbidade administrativa. “O uso dos CNPJs diferentes aumentou o poder de compra mediante dispensa de licitação e tudo era feito com o conhecimento do Prefeito, que além de concordar com a fraude, indicava aos funcionários o quanto poderia ser emitido em cada nota fiscal sem necessidade da realização de procedimento licitatório”, afirma.

A sentença, em caráter liminar, foi acolhida pela Vara Única da Comarca de Campo Erê, que reconheceu os fortes indícios de irregularidades e indisponibilizou os bens dos investigados como medida cautelar para o integral ressarcimento ao erário, caso a denúncia seja confirmada de forma definitiva. A liminar é passível de recurso. (Autos n. 0900006-41.2016.8.24.0013)”

No mesmo sentido o órgão de Auditoria Interna do Ministério Público da União (http://www.auditoria.mpu.mp.br/bases/arqvs_corag/sel-2466B-2014-fracionamento-i-PRT-24.pdf, o Ministério Público da União), exarou parecer esclarecedor:

“6. Sobre o assunto, a Egrégia Corte de Contas já se pronunciou nesse mesmo sentido, a exemplo do Acórdão 23/97 – Plenário: “… afronta ao art. 20 da Lei n. 8.666/93; considerando que, em decorrência da referida descentralização dos recursos, na composição do preço final praticado pela empresa contratada foram inseridos custos adicionais que não seriam incluídos caso a licitação tivesse sido executada no local da prestação dos serviços, tornando, por conseguinte, antieconômico o procedimento, conforme resultou apurado”.

7. Acrescente-se, por oportuno, as lições de Marçal Justen Filho que assevera ‘se a Administração necessitar de diferentes objetos, mas para fornecimento em locais diversos, não se aplicará o dever de somatório (…). Poderá fazer-se compra com dispensa em virtude do valor ou convite, se for o caso. Isso importa a distinção também a propósito da unidade adquirente. A descentralização significa que se devem considerar apenas as contratações realizadas pelas diferentes unidades administrativas, mesmo que sem autonomia jurídica em sentido próprio’ (Licitações e Contratos, Editora Dialética, 11ª ed., São Paulo, 2005, p.213).

8. Percebe-se que a legislação e a doutrina indicam que a repartição interessada deve ser o ponto de referência para efeito de se efetuar o planejamento, bem como a efetivação das contratações, objetivando garantir ao procedimento maior celeridade e economicidade”. (Grifo nosso) (PARECER CORAG/SEORI/AUDIN – MPU/Nº 045/2008)

Nesse caso, a expressão “repartição interessada” deve ser interpretada como a beneficiária da aquisição, no caso, a Prefeitura, razão de adotar-se maior cautela nas contratações por meio de “dispensa de licitação”, ainda que sejam feitas por unidades gestoras distintas.

Publicado em 07 de março de 2017

(Colaborou Dr. Ariosto Mila Peixoto, advogado especializado em licitações e contratos administrativos, no escritório AMP Advogados).

*Alguns esclarecimentos foram prestados durante a vigência de determinada legislação e podem tornar-se defasados, em virtude de nova legislação que venha a modificar a anterior, utilizada como fundamento da consulta

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