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Donos de empresas de ônibus questionam contrato de licitação

A contratação de empresas de consultoria pela prefeitura e pelos empresários de ônibus para analisar o equilíbrio econômico-financeiro do sistema de transporte de Salvador pode resultar na revisão de cláusulas do contrato de licitação das linhas urbanas. O documento foi firmado em 2014 entre o município e as três empresas que operam os coletivos da cidade.

O “afrouxamento” de regras, com o objetivo de sanar problemas gerados pela crise econômica, é a tese defendida por donos de empresas. Eles reclamam da queda da demanda nos coletivos após a assinatura do contrato de concessão e, por isso, são criticados pela prefeitura e por promotores do Ministério Público do Estado da Bahia (MP-BA).

A possibilidade de renegociação de obrigações previstas no contrato, levantada pelos empresários dos ônibus, foi confirmada à reportagem de A TARDE pelo secretário de Mobilidade de Salvador, Fábio Mota. Contudo, a prefeitura está cuidando do assunto com cautela. Prefere, segundo Mota, esperar o resultado das análises feitas pelas consultorias para falar objetivamente sobre o assunto.

Atualmente, o secretário defende que nada seja alterado, mas o resultado das duas consultorias pode mudar esse posicionamento, admite o próprio gestor. Isso porque a possibilidade de alteração de cláusulas é prevista no contrato, desde que haja “desequilíbrio financeiro” para as empresas.

“A partir das análises que estão sendo feitas, será avaliado se existe o desequilíbrio econômico que eles [os empresários] tanto reclamam. Aí, sim, poderemos discutir medidas, como o alongamento da idade da frota ou do prazo para o pagamento da outorga”, reconheceu Mota.

A previsão do secretário e de empresários ouvidos por A TARDE é de que a decisão sobre a alteração de cláusulas do contrato se dê em janeiro, quando a Deloitte, contratada pela prefeitura, e a Ernest&Young, que está trabalhando para empresários, concluirão os trabalhos. O resultado da consultoria poderá gerar impacto no preço da tarifa (veja matéria abaixo).

Demanda

De acordo com o diretor-executivo da empresa Salvador Norte e ex-diretor do sindicato das empresas de ônibus (Setps), Horácio Brasil, o número de passageiros transportados pelas três operadoras do sistema caiu de 28 milhões para 22 milhões entre 2014 e 2016.

A venda de vale transporte, principal termômetro financeiro para o setor, foi afetada, segundo ele, pela recessão econômica que fez setores importantes da economia, como a construção civil, recuarem.

O representante empresarial reclama, ainda, do grande valor que as empresas tiveram que desembolsar ao ganhar a licitação. Do total de R$ 190 milhões da outorga, 20% foram pagos à vista e os outros 80% parcelados em cinco anos.

Além disso, 1.060 novos coletivos tiveram que ser comprados (pelo valor de R$ 280 mil cada um), com o objetivo de diminuir a idade média da frota de ônibus. “Juntou a crise econômica com as regras rígidas da concessão do sistema e resultou nisso”, afirma Horácio Brasil. “Sempre digo que temos regras de primeiro mundo em um país todo complicado”, disse o empresário.

A empresa Salvador Norte, que ele dirige, é a que enfrenta maiores problemas financeiros, segundo a equipe de A TARDE apurou junto a fontes do setor de transporte rodoviário.

A versão é confirmada pelo próprio Horácio Brasil: “Nossa situação é a pior, mas as outras não estão muito melhor”, avalia o dirigente empresarial. Originária do antigo grupo espanhol Vibemsa – que condensava empresas como Ondina, Rio Vermelho, BTU e Verdemar –, a Salvador Norte opera na orla e no centro da capital baiana.

Divide a operação do sistema de transporte urbano mais duas concessionárias: a Plataforma (empresa do grupo Evangelista que domina o Subúrbio Ferroviário há 40 anos) e OT Trans (sociedade composta por outras empresas que já atuam na cidade há anos, como Capital, Modelo, União, Expresso Vitória e outras).

Tarifa

Entre os pontos que estão sendo analisados pelas empresas de consultoria Delóitte e Ernest&Young, contratadas respectivamente pela prefeitura e pelos empresários, está o valor da tarifa de ônibus da capital baiana, conforme A TARDE apurou com fontes do setor.

Segundo a Secretaria Municipal de Mobilidade (Semob), a tarefa de avaliar quanto deve custar a passagem nos coletivos de Salvador foi dada à Agência de Regulação de Salvador (Arsal), órgão municipal presidido pelo advogado Henrique Trindade. O órgão confirma que uma empresa foi contratada para auxiliar na função, mas não revela o nome da companhia.

O reajuste da tarifa feito em 2017, como já era previsto no contrato de licitação, deve considerar a planilha de custos das empresas de ônibus – e não o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), como aconteceu nos últimos anos.

A Arsal usará critérios como gastos com pneus, combustível, folha de pagamento das empresas, manutenção, entre outros custos da operação dos sistema, para definir o valor da passagem de ônibus da cidade.

Essa regra, criada para que a tarifa arrecadada consiga pagar o preço de operação do sistema, poderá, na avaliação de fontes do setor, provocar um aumento na passagem maior que a inflação medida pelo IPCA.

Isso porque, caso regras contratuais não sejam “afrouxadas”, como querem os empresários de ônibus, eles tendem a pressionar a prefeitura para que o novo reajuste da tarifa seja suficiente para tornar o sistema rentável. Essa rentabilidade é prevista pelo contrato de concessão do sistema.

Ministério Público

Por causa dos problemas financeiros reclamados pelas empresas de ônibus, um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) foi assinado este ano, sob a tutela do MP-BA, para que o pagamento das parcelas da outorga à prefeitura fosse suspenso até a conclusão do trabalho de consultoria das empresas Dellóite e Ernest&Young.

À frente do caso, a promotora de Justiça Rita Tourinho critica os argumentos usados pelos empresários para pedir a renegociação de cláusulas do contrato de licitação.

Segundo ela, itens como “risco de demanda” são contratualmente de responsabilidade empresarial.

“Quando eles assinaram o contrato, sabiam disso, e quando decidiram participar da licitação também sabiam da exigência de compra de ônibus e pagamento da outorga”, afirmou Tourinho. A promotora defende que, “se depender do Ministério Público, não poderá ser repactuado absolutamente nada que afete o usuário, como ampliação da idade da frota”.

Responsável pela licitação que concedeu a operação do sistema de ônibus por 25 anos aos mesmos empresários que já atuavam na cidade, o secretário de Mobilidade de Salvador, Fábio Mota, defende a qualidade do processo licitatório feito em 2014 pelo município.

Para ele, “não é culpa da prefeitura, mas sim da crise econômica” os problemas financeiros das empresas.

“A economia do país encolheu nesse período. A relação é essa, não com o processo de licitação”, afirma.

Fonte: A Tarde

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