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Como acontece o choque de gigantes das armas num mercado bilionário

O pregão para venda de pistolas à Brigada Militar é apenas a ponta de um iceberg no acirrado mundo dos negócios bélicos. Duas das principais concorrentes, a austríaca Glock e a italiana Beretta, estão entre as maiores vendedoras de armas de defesa pessoal no mundo. A concorrência aberta no Rio Grande do Sul tem ainda outra empresa tradicional, a suíça Sig Sauer. A Taurus não participa desse certame no RS, porque não atendia às especificações solicitadas (faltava uma homologação do Exército).

Para dar uma ideia do gigantismo do mercado, a Glock é a maior exportadora de armas para o mercado norte-americano (o maior do mundo) e a empresa gaúcha Taurus, a segunda da lista. Ambas, além disso, possuem fábricas nos EUA.

Mas não são os EUA, e sim o Brasil a atual meca da corrida por armas de defesa pessoal no planeta. Isso porque as vendas aqueceram após a vitória eleitoral de Jair Bolsonaro, um defensor da indústria bélica. Estudos feitos por lobistas do setor indicam que até 6 milhões de brasileiros estariam dispostos a adquirir uma arma, para uso em casa ou na rua. É um mercado que pode render R$ 12 bilhões e representa aumento significativo quanto ao total de armas oficialmente legalizadas por cidadãos no Brasil até 2019: 331 mil armas de defesa pessoal (pessoas físicas) registradas no Sistema Nacional de Armas (Sinarm, que controla armamento em poder da população) e 350 mil pertencentes a caçadores, atiradores e colecionadores. Outras 327 mil estão em nomes de empresas ou forças policiais.

Na corrida para fornecer armas ao setor privado – sobretudo cidadãos desejosos de portar algo para defesa pessoal – a Taurus tem levado vantagem, por possuir fábrica no Brasil. Nascida há 80 anos no Rio Grande do Sul, domina hoje o rarefeito mercado brasileiro das vendas em loja. Possui indústria em São Leopoldo (RS) e também na Geórgia (EUA). Fabrica 4 mil armas por dia, 85% delas vendidas no Exterior. Já produziu mais de 20 milhões de armas. Aposta sobretudo na entrega rápida de armas a particulares.

A Taurus não para de vencer concorrências mundo afora. Entre 2018 e 2019 acertou a venda de 20 mil pistolas para as Filipinas. Participará também de licitação para fornecer 12,4 mil fuzis naquele país. Em 2019, fechou também venda de 1,5 mil pistolas para a África do Sul e mil pistolas para a Ucrânia.

Já outra gigante, a Glock (na disputa para fornecer armas à BM), encontrou nas licitações do setor público o seu filé. Fundada nos anos 1980, ficou famosa por fabricar pistolas com grande parte dos componentes em polímero plástico, mais leves e menos suscetíveis à corrosão. Outras a copiaram, nos anos subsequentes. Ela é fornecedora atual de pistolas para 45 países, incluindo as forças armadas britânicas e francesas. Não possui fábrica no Brasil.

Entre os últimos negócios, a Glock acertou em 2018 a venda de 27 mil pistolas para as forças de segurança do Rio de Janeiro e em 2020, a comercialização de 5 mil pistolas para a Polícia Civil do Distrito Federal. Mas um dos maiores negócios de sua história foi fechado em 2019: a venda de 40 mil pistolas calibre .40 e 1,3 mil fuzis para a Polícia Militar paulista, no ano passado (10 vezes maior que o pregão para a BM gaúcha).

Já a Taurus não participou da concorrência paulista. Ela estava impedida temporariamente de participar de licitações do governo do Estado de São Paulo. Recebeu multa administrativa de R$ 12,6 milhões, por algumas falhas em armas fornecidas à PM paulista. A Taurus recorreu e a multa foi anulada, mas a licitação paulista já tinha saído.

A disputa no Brasil não se resume à Glock x Taurus. Ceará, Goiás e Mato Grosso do Sul compraram pistolas Sig Sauer (4 mil, 700 e mil, respectivamente). A PM do Distrito Federal tem testado pistolas tchecas CZ, possível fornecedora. A PM do Espírito Santo comprou metralhadoras pesadas Negev, da israelense IWI. O pregão da Secretaria Nacional de Segurança Pública está alinhado para comprar as Beretta (caso essa indústria não sofra desclassificação).

Lobby inclui visitações a fábricas e influência no governo
O duelo entre as titãs das armas é movido a lobbies diversos. Além de contar com tradicionais influenciadores no Congresso e no Executivo, as empresas costumam patrocinar viagens a suas plantas industriais, recheadas de programas atrativos. Isso aconteceu em 2019, por exemplo, quando parlamentares governistas foram levados em comitiva a fábrica da Taurus, ou em 2020, quando policiais brasileiros foram convidados a uma feira de armas nos EUA. Tudo isso, mesmo antes de ser aberta uma concorrência. Muitas vezes são feitas doações para polícias, especialmente às vésperas de uma grande possibilidade de venda.

Quando a licitação está em jogo, a influência é tentada em duas etapas. A primeira é a da capacitação técnica: o fabricante tenta provar que sua arma é melhor que a do concorrente. E vice-versa. Vale tudo para tentar expor o rival ao ridículo, como vídeos como o que mostra supostas falhas da Glock ou incidentes com armas da Taurus, que surgiram “misteriosamente” nas redes.

A segunda e decisiva etapa é a do preço. A lógica é ganhar a indústria que fizer a melhor oferta custo/benefício. Foi assim que a Glock, por exemplo, venceu a licitação para a PM paulista, reduzindo na última hora o custo da pistola à quase metade do cotado inicialmente. Terá lucro porque a quantidade vendida é de dezenas de milhares de armas.

O pregão da Brigada Militar ainda está na fase de capacidade técnica. Nas redes sociais, internautas acusam o comando da BM de pender para uma ou outra empresa. Falam em testes irregulares, quebra de regras, privilégio no preço e não na qualidade a arma. Nada disso tem confirmação.

As empresas e os testes para a licitação no RS
O que diz a Glock:

Em nota, a fabricante de armas ressalta que sua pistola calibre .40 tem três travas de segurança, sendo uma trava de gatilho, uma trava de percussor e uma trava de queda. Que as mesmas atuam sequencialmente e que as pistolas Glock são consagradas mundialmente e são usadas por centenas de forças militares e policiais ao redor do mundo, possuindo certificações na Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan).

A empresa estranha que a comissão da Brigada Militar decidiu fazer um teste não previsto no edital de licitação, sem a presença das três travas de segurança.

“Desmembrando apenas o ferrolho, a comissão acabou desprezando a presença da trava de gatilho e da trava de queda que se encontram exclusivamente na armação. Não obstante, também removeram a trava de percussor presente no ferrolho…com o objetivo de simular uma falha no sistema de segurança da pistola. A utilização apenas do ferrolho desprovido da trava de segurança do percussor, induziu e induzirá à erro qualquer resultado realizado, seja na GLOCK ou em qualquer outro fabricante, sem exceção”.

O que diz a Taurus:

A Taurus decidiu não se pronunciar sobre os testes, até porque não participa do pregão.

Fonte: Gaúcha ZH

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