RELATÓRIO FINAL. BREVE HISTÓRICO DOS TRABALHOS
A publicação da Lei 8.666, em 1993, representou claro divisor de águas para os processos de aquisição efetuados pelo Estado brasileiro e nos contratos deste com o setor privado, antes regidos pelo Decreto-Lei 2.300, de 21 de novembro de 1986. O contexto para sua propositura foi dado pela avaliação de que os dispositivos do Decreto-Lei facilitavam sistematicamente o cometimento de fraudes, mas, além disso, era a própria Constituição de 1988, em seu art. 37, XXI, que exigia novo regramento à sistemática de aquisições públicas. As tratativas para a confecção da nova lei tiveram duração de quase dois anos e quando de sua publicação, em 1993, já se haviam passados mais de cinco anos de promulgação da Carta Magna.
A vigência da Lei nos últimos 20 anos significou avanços que, embora emblemáticos pela ruptura com o passado que representaram, não permitiram a adequada equalização entre as necessidades da administração e as complexidades do mercado. O seu conteúdo tem se mostrado com frequência pouco prático ou mesmo inexequível. Por um lado cria insegurança para os administradores públicos responsáveis pelos procedimentos a que se refere – independentemente da capacitação a eles oferecida –, e, de outro, deixa margens excessivas para práticas desleais de quem vende para a administração.
Em seu conjunto, isto abriu espaço para certo ativismo dos órgãos de controle e para a proliferação de normativos infralegais que, apesar de terem tido como foco, em sua maioria, atualizar a legislação, acabaram por enrijecer os seus dispositivos, em prejuízo do próprio espírito da Lei. Mas as reformas não se limitaram ao arcabouço infralegal. Ainda que
nenhuma macrorreforma tenha sido realizada, é marcante que desde 1993, ano de publicação da Lei 8.666, a legislação voltada para compras públicas no Brasil tenha sofrido inovações por meio de 80 normas, das quais 61 Medidas Provisórias, média de 3 por ano, e 19 Leis, média de 1 por ano.
Trabalho realizado pela Consultoria do Senado1, aponta que o conjunto de reformas já executado sobre o tema optou ora por mudanças pontuais, ora pela edição de legislação inovadora. Entre estas, são dignas de registro a Lei 10.520, de 17 de julho de 2000, que instituiu o pregão; a Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006, que conferiu tratamento favorecido a microempresas e empresas de pequeno porte; a Lei nº 12.232, de 29 de abril de 2010, que trata de licitação e contratação de serviços de publicidade; a Lei nº 12.462, de 4 de agosto de 2011, que instituiu o Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC), e as que dela decorreram com o fim de expandir seu alcance; e a Lei nº 12.598, de 22 de março de 2012, que estabeleceu normas especiais para compras e contratações de produtos e de sistemas de defesa.
Entre as mudanças pontuais, limitada a análise às que foram promovidas mais recentemente, sobressaem em número as que ampliaram as possibilidades de dispensa de licitação. Desde 2007, foram acrescentados ao rol de dispensas previstas no art. 24 da Lei 8.666, de 1993, objetos tão distintos quanto bens e serviços das Forças Armadas emoperações de paz, a prestação de serviços de assistência técnica e extensão rural, as aquisições com transferência de tecnologia para o SUS e a implementação de cisternas. Inicialmente em número de 15, hoje as dispensas somam 33, como bem relaciona o estudo acima citado.
Ainda na esteira das mudanças promovidas no próprio texto da Lei 8.666, de 1993, não se pode deixar de mencionar a realizada pela Lei 12.349, de 2010, que instituiu margens de preferência para produtos manufaturados e para serviços nacionais que atendam a normas técnicas brasileiras. Em primeira análise, tal mudança foi significativa porque reorientou o princípio, antes consagrado na Lei, de vedação a cláusulas ou condições que pudessem comprometer, restringir ou frustrar o caráter competitivo de certames, por indicação de preferências ou distinções quaisquer. Esta mudança é importante para um grupo de fornecedores nacionais, mas não pode representar redução da competitividade para quem compra. Ainda deverão ser avaliados os resultados das medidas impostas pela Lei 12.349, de 2010, sobre a economia brasileira.
DAS PROPOSIÇÕES REMETIDAS À COMISSÃO
O interesse que a matéria das compras públicas desperta é ainda traduzido pelos mais de 500 projetos em tramitação a seu respeito no Congresso Nacional. Não obstante a falta de competência regimental para exame deliberativo de projetos em tramitação, foram remetidas para análise dessa relatoria as seguintes proposições: PLC n° 32, de 2007, de autoria do Presidente da República, e que contou, em sua última movimentação no Senado Federal com a relatoria do Senador Eduardo Suplicy; PLS nº 262, de 2012, de autoria do Senador Roberto Requião; PLS nº 450, de 2012, deautoria do Senador Paulo Paim; e PLS nº 56, de 2012, do Senador Pedro Taques.
Esses projetos, ressalte-se, deverão retomar o seguimento original de suas tramitações, considerando não haver, como já realçado, competência por parte da Comissão Especial instituída pelo Ato do Presidente nº 19 para sobre eles formalmente deliberar.
Em relação ao projeto ora oferecido, é importante salientar que o seu exame forçou considerações que ultrapassaram os limites da Lei 8.666, de 1993. Nesse sentido, o projeto pretende substituir não apenas a Lei 8.666, de 1993, mas também a Lei nº 10.520/2002, que instituiu o pregão, e a Lei nº 12.462/2011, que instituiu o Regime Diferenciado de Contratações
Públicas (RDC). Pelas suas características muito específicas, não pretendeu, entretanto, adentrar no mérito das questões atinentes às Concessões, moldadas pela Lei nº 8.987, de 1995, às Parcerias Público- Privadas, ditadas pela Lei nº 11.079, de 2004, e nem mesmo às licitações de publicidade e de produtos de defesa, reguladas pela Lei nº 12.232, de 2010, e pela Lei nº 12.598, 2012, respectivamente.
Reconhecidos os êxitos da legislação vigente, não faria sentido a simples substituição de suas cláusulas por regramento inteiramente novo. Por isso, em grande medida, o projeto pode ser entendido como uma proposta de compilação dos diplomas legais citados, acrescida de inovações.