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Lei Federal nº 12.349, de 15 de dezembro de 2010

Conversão da Medida Provisória nº 495/2010


O que muda nas licitações?

O texto da MP nº 495, alterado e convertido na Lei Federal nº 12.349/2010, teve finalidade protecionista e de desenvolvimento nacional, a incluir o desenvolvimento sustentável como diretriz governamental.  Dentre outros, abre a possibilidade de o Governo adquirir produtos ou serviços nacionais por preço até 25% superior ao estrangeiro; produtos fabricados no âmbito do Mercosul  poderão , após acordo internacional, desfrutar  do mesmo benefício. Ratifica ainda a possibilidade de licitações para sistemas de tecnologia de informação e comunicação, restritas a empresas que detenham tecnologia desenvolvida no País além do processo produtivo básico (conjunto mínimo de operações, no estabelecimento fabril, que caracteriza a efetiva industrialização de determinado produto).

 

Vejamos as alterações (o texto da Lei 12.349/10 está transcrito):

 

Art. 3o  A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a administração e a promoção do desenvolvimento nacional sustentável, e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos. (g.n.)

 

 

Comentário: Além de garantir “a observância do princípio constitucional da isonomia” e a “seleção da proposta mais vantajosa”, incluiu-se no dispositivo, outra finalidade da licitação, qual seja, a de “promoção do desenvolvimento nacional sustentável”. O Estado, na condição de grande consumidor de produtos e serviços, deve ser o precursor e dar o exemplo de boas práticas de proteção ao meio ambiente. A introdução de critérios ambientais e sócio-econômicos na promoção do desenvolvimento nacional, sobretudo nas licitações e contratações públicas, mais do que ensinam, conduzem a população a respeitar o ambiente em que vivemos. As leis e normas rígidas cumprem a sua parte no processo de conscientização, mas é a atitude do governo que convence e “arrasta a multidão”.

Segundo o princípio da supremacia do interesse público, o Estado tem o dever de atender ao interesse coletivo e promover gestões eficientes a manter o conjunto social e a dignidade da pessoa humana. Obviamente, a manutenção de uma sociedade bem atendida requer, como pressuposto, a preservação dos recursos naturais e os modelos políticos, econômicos e sociais adequados, que não comprometam a capacidade das gerações futuras de satisfazer suas próprias necessidades. Sem eles, nossos descendentes terão sua capacidade de evolução ameaçada em razão da canibalização e degradação daquilo que nos era disponível. A proteção do meio ambiente é um dos elementos da cadeia sustentável; nela estão inseridos, ainda, o equilíbrio na distribuição de renda, a conscientização da população e o respeito aos direitos fundamentais do ser humano.

E qual será o papel do Governo nesse contexto? É dever do Estado, na condição de verdadeiro “tutor”, fornecer as diretrizes à manutenção dos recursos naturais para as próximas gerações. As contratações do governo tanto para bens como para serviços devem estabelecer critérios que exijam dos seus fornecedores a proteção do meio ambiente. Nesse caso, a teoria é mais simples do que a prática. A fixação de cláusulas nos editais de licitação que obriguem os fornecedores a atender essa ou aquela exigência, pode esbarrar na aspiração do governo fundamentada no conceito do menor preço. A busca obstinada – e às vezes, cega – pelas aquisições de menor custo levam à frustração, em boa parte das licitações. Não é raro verificar-se que a empresa vencedora da licitação pela oferta do menor preço, não executou o contrato ou o cumpriu de forma inadequada e insatisfatória.

Ora, critérios de proteção do meio ambiente vão exigir, num primeiro momento, medidas de custo moderado a alto, a proporcionar a elevação dos preços em relação aos praticados atualmente nos contratos do governo.  A pesquisa, as soluções inovadoras, a fabricação de produtos com matéria prima reciclada, utilização de insumos não poluentes, veículos de transporte público movidos a hidrogênio e biodiesel, locais adequados ao descarte de materiais inservíveis ou sobras da construção civil, substituição de equipamentos e produtos que permitam o uso racional da água e da economia de energia elétrica etc., indubitavelmente ensejarão a alteração da matriz econômico-financeira dos contratos atuais.

Por isso, a Administração Pública deverá estar consciente de que a necessária e imprescindível política de licitações sustentáveis provocará, inexoravelmente, a elevação de preços. Reconheço que ao longo do tempo bem como a padronização de políticas sustentáveis e a competitividade entre as empresas, reconduzirão os valores dos contratos a patamares normais, todavia, nessa fase inicial de implantação das licitações sustentáveis, o aumento será inevitável.

E entendo que nessas circunstâncias o aumento do preço dos contratos administrativos – além de inevitável – não contrariará o interesse público, antes, o preservará.  O conceito pleno de “proposta mais vantajosa” não é e nem equivale à noção singela de “menor preço”. Mais vantajosa é a proposta que atende adequada e satisfatoriamente a demanda pública. Ou seja, somente depois de avaliar se o bem ou serviço ofertados atendem ao interesse da coletividade, é que, como critério secundário, será escolhido o menor preço. Fazendo uso do antigo jargão popular: “não se faz a omelete sem quebrar os ovos”; não há como modificar as regras de contratação pública sem o infalível aumento de custos. Outrossim, o governo não pode deixar de fazê-lo, sob pena de, pela omissão, retardar ou mesmo colocar em risco a sustentabilidade das licitações e a preservação do meio ambiente.

A lei federal impõe a “promoção do desenvolvimento nacional sustentável” não só como um princípio norteador da licitação, mas especialmente um objetivo a ser alcançado pela Administração Pública. A dimensão continental de nosso País e a concentração de renda em regiões desenvolvidas resulta no desequilíbrio social e econômico da população que vive no Brasil. Desenvolver o País em sua totalidade – a contemplar tanto as regiões menos favorecidas como as mais desenvolvidas – com vistas a diminuir a disparidade existente, parece ser o grande objetivo pretendido pela nova lei.

 

§ 1o  É vedado aos agentes públicos:
I – admitir, prever, incluir ou tolerar, nos atos de convocação, cláusulas ou condições que comprometam, restrinjam ou frustrem o seu caráter competitivo, inclusive nos casos de sociedades cooperativas, e estabeleçam preferências ou distinções em razão da naturalidade, da sede ou domicílio dos licitantes ou de qualquer outra circunstância impertinente ou irrelevante para o específico objeto do contrato, ressalvado o disposto nos §§ 5o a 12 deste artigo e no art. 3o da Lei no 8.248, de 23 de outubro de 1991. (g.n.)

 

 

Comentário: O inciso I do § 1º proíbe a restrição ou a frustração do caráter competitivo, contudo, excepciona o benefício concedido aos produtos e serviços nacionais. Logicamente, o disposto na presente MP cria privilégio e instaura a quebra ao princípio da isonomia em sentido geral, uma vez que, para o desempate de propostas, produtos importados serão preteridos em relação aos nacionais. Vale dizer que os editais não poderão ser invalidados por constarem cláusula de privilégio aos produtos nacionais, posto que previsto na legislação.

O destaque feito às sociedades cooperativas é mais um lembrete à não inclusão de exigências em editais de licitação ou em contratos que acabem por inibir ou impedir a participação das sociedades cooperativas. Logicamente, o disposto na nova lei não determina que a participação das sociedades cooperativas possam ocorrer sem qualquer freio ou cautela; entendo que a participação das cooperativas na licitação seja possível desde que a atividade licitada seja compatível com o regime jurídico e limites legais do cooperativismo.

 

§ 5o  Nos processos de licitação previstos no caput, poderá ser estabelecida margem de preferência para produtos manufaturados e para serviços nacionais que atendam a normas técnicas brasileiras.

§ 6o  A margem de preferência de que trata o § 5o será estabelecida com base em estudos revistos periodicamente, em prazo não superior a 5 (cinco) anos, que levem em consideração:
I – geração de emprego e renda;
II – efeito na arrecadação de tributos federais, estaduais e municipais;
III – desenvolvimento e inovação tecnológica realizados no País;
IV – custo adicional dos produtos e serviços; e
V – em suas revisões, análise retrospectiva de resultados.

 

 

Comentário: O § 5º instala a faculdade de ser dada preferência aos produtos e serviços nacionais e que atendam a normas técnicas brasileiras.

Imprescindível, a princípio, conceituar as expressões: produtos manufaturados nacionais e serviços nacionais (art. 6º, XVII e XVIII):

“XVII – produtos manufaturados nacionais – produtos manufaturados, produzidos no território nacional de acordo com o processo produtivo básico ou regras de origem estabelecidas pelo Poder Executivo Federal;

XVIII – serviços nacionais – serviços prestados no País, nas condições estabelecidas pelo Poder Executivo Federal;”.

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