O avanço das normas de controle, transparência e governança no setor público brasileiro ganhou reforço com a publicação do Decreto que regulamenta o artigo 25, § 4º, artigo 60, caput e inciso IV, e artigo 163, parágrafo único, todos da Lei nº 14.133/2021 (Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos). Este decreto estabelece os critérios para avaliação e implementação dos Programas de Integridade – também chamados de Programas de Compliance – àqueles que contratam com o poder público, a reforçar a responsabilidade corporativa e promover uma relação mais ética e eficiente entre iniciativa privada e administração pública.
Com efeito, o objetivo da norma é a prevenção, detecção e correção de desvios, fraudes, irregularidades e atos lesivos praticados contra a administração pública, nacional ou estrangeira. Além disso, também se destaca a mitigação dos riscos sociais e ambientais, como meio destinado à proteção dos direitos humanos e, por fim, o fomento à cultura de integridade no ambiente corporativo.
A implementação de programas de integridade no ambiente corporativo será exigido pela Administração Pública nos seguintes casos:
- Contratações públicas de grande porte (art. 25, § 4º, da Lei 14.133/21) : embora a Lei federal tenha indicado um limite mínimo de valor substancial (atualmente em R$ 239 milhões), é sabido que vários estados mantêm a exigência do programa de integridade para contratações de valores significativamente menores .
- Critérios de desempate em processos licitatórios (artigo 60, caput e inciso IV).
- Condição para reabilitação de empresas sancionadas (artigo 163, parágrafo único).
- Critério utilizado na definição da sanção administrativa aplicável no caso de infrações cometidas pelo licitante ou contratado (art. 156, § 1º, V).
A Controladoria-Geral da União (CGU) definirá os critérios mínimos e a metodologia de avaliação para considerar um programa de integridade como efetivamente implantado.
O decreto, apesar de ser de âmbito federal, estende-se também aos entes estaduais e municipais que recebam transferências voluntárias da União.
Assim, conforme o artigo 2º, um programa de integridade consiste em mecanismos internos de prevenção, detecção e correção de atos ilícitos, com foco em práticas anticorrupção e proteção dos direitos humanos e ambientais.
O sistema de avaliação, como medida para apurar a efetivação da implantação do programa de integridade na empresa, obedecerá aos seguintes parâmetros:
- Comprometimento da Alta Direção, evidenciado pelo suporte institucional e pela alocação de recursos.
- Códigos de Conduta e Ética, com cláusulas abrangentes e de aplicação a todos os níveis hierárquicos.
- Gestão de Riscos, com análise periódica para ajustes e adaptações.
- Treinamento e Comunicação periódicos, destinados à promoção de uma cultura ética.
- Controles Internos e Auditoria, a garantir registros financeiros precisos e relatórios fidedignos.
- Canais de Denúncia e Medidas Disciplinares baseados em estruturas seguras e eficazes para denunciar e corrigir irregularidades.
Esses elementos são fundamentais para garantir a conformidade legal e prevenir fraudes e corrupção nos contratos administrativos.
O decreto ainda confere à CGU dois tipos de atuação junto às empresas contratadas:
- Preventiva: Mediante orientação, avaliação e supervisão. A CGU pode emitir relatórios e criar programas de conformidade para empresas avaliadas.
- Repressiva: Mediante processo administrativo para apurar infrações e aplicar sanções administrativas, como multas de 1% a 5% do valor do contrato, impedimento de licitar e declaração de inidoneidade.
As infrações incluem entrega de documentos falsos, omissão de informações e fraude nas declarações comprobatórias da implantação do programa de integridade.
Por fim, o Decreto constitui um marco relevante na modernização do Direito Administrativo brasileiro. Ao fomentar a cultura de integridade (compliance) no ambiente corporativo o decreto potencializa o fortalecimento da ética na relação entre a administração pública e as empresas privadas. Ao estabelecer critérios claros para a avaliação dos programas de integridade, a norma confere robustez à governança pública, evita práticas anticoncorrenciais e reduz os riscos de corrupção nos contratos administrativos.
Publicado em 11 de dezembro de 2024
Dr. Ariosto Mila Peixoto, advogado especializado em Licitações e Contratos no Escritório Ariosto Mila Peixoto Advogados Associados.
*Alguns esclarecimentos foram prestados durante a vigência de determinada legislação e podem tornar-se defasados, em virtude de nova legislação que venha a modificar a anterior, utilizada como fundamento da consulta