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Competência Legislativa

 O que é competência legislativa privativa, concorrente e suplementar?

Privativa: é a competência plena, direta e exclusiva de legislar.
Concorrente: é a competência comum.
Suplementar: é uma subespécie da competência concorrente; é aquela que preenche os vazios da norma geral; para alguns ela é “complementar”  (aos Estados cabe complementar as normas gerais).

Nos termos do artigo 22, inciso XXVII da Constituição Federal, é de competência privativa da União legislar sobre normas gerais de licitação, in verbis:

Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:
(…)
XXVII – normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades, para as administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, obedecido o disposto no art. 37, XXI, e para as empresas públicas e sociedades de economia mista, nos termos do art. 173, § 1°, III; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

O fato de a Constituição definir como competência privativa da União legislar certas matérias, in casu, normas gerais de licitação e contratação, permitiu aos Estados legislarem suplementarmente, conforme § 2º do artigo 24 da Constituição:
§ 2º – A competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui a competência suplementar dos Estados.

Bem assim, aquilo que for vedado (explícita ou implicitamente) pela Constituição, não será objeto de normatização por parte dos Estados:
Art. 25. …
§ 1º – São reservadas aos Estados as competências que não lhes sejam vedadas por esta Constituição

A competência legislativa plena dos Estados somente poderia ser exercitada se não houvesse as normas gerais de licitação definidas na Lei 8.666/93, conforme o § 3º do mesmo artigo:
§ 3º – Inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a competência legislativa plena, para atender a suas peculiaridades.

Portanto, os Estados não podem legislar sobre normas gerais de licitação – as da Lei 8.666/93 – em face da competência privativa da União sobre essa matéria. Bem versou JOSÉ AFONSO DA SILVA  ao asseverar a respeito dos Estados: “Veda-se-lhes implicitamente tudo que tenha sido enumerado apenas para a União e para os Municípios. Assim, a matéria relacionada nos arts. 20, 21 e 22 explicitamente como de competência da União está implicitamente interditada aos Estados”.

Dessa forma o poder regulamentar dos Estados, Distrito Federal e Municípios em normas de licitação deve limitar-se à competência suplementar (ou complementar). Naquilo que a norma federal (norma geral) já preceituou, exauriu e esgotou, não terá lugar a competência suplementar.

Cabe observar o que ANDYARA KLOPSTOCK SPROESSER  estabeleceu: “Desde logo, entendemos que, se a algum ente é dado suplementar, também lhe será possível complementar, até porque o conceito de suplementação é mais amplo, mais abrangente do que o conceito de complementação, de tal modo que quem pode suprir a falta, há de poder, por mais forte razão, completar os vazios da legislação. Aliás, os vazios são vazios porque algo neles não existe, e deve ser suprido, suplementado”.

Da mesma forma, aos Municípios é dado o direito de suplementar a norma federal, naquilo que couber e lhe for possível:
Art. 30. Compete aos Municípios:
(…)
II – suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;

Nesse diapasão, as regras criadas pela Lei Federal nº 8.666/93 não podem ser alteradas; podem ser, sim, complementadas, o que é muito diferente.

Sob os falsos auspícios da complementação ou suplementação, as normas gerais de licitação, contidas na Lei Federal nº 8.666/93 e até a Lei Federal nº 10.520/02, vêm sofrendo alterações e abusos. Em verdade, a matéria privativa da União – normas gerais de licitação e contratos – vem sendo objeto de nova regulamentação de alguns Estados e Municípios, que alteram significativamente as regras e procedimentos já criados e definidos pelas leis federais.

Por exemplo, o julgamento das fases de habilitação e proposta é tema recorrente quando se trata das alterações inconstitucionais de certos regulamentos.

A Lei 8.666/93 foi clara em estabelecer que a Comissão analisará primeiro a habilitação e depois a proposta, conforme dispõe:
“art. 43 – A licitação será processada e julgada com observância dos seguintes procedimentos:
I – abertura dos envelopes contendo a documentação relativa à habilitação dos concorrentes, e sua apreciação;
(…)
III – abertura dos envelopes contendo as propostas dos concorrentes habilitados, desde que transcorrido o prazo sem interposição de recurso, ou tenha havido desistência expressa, ou após o julgamento dos recursos interpostos;

Indiscutível, portanto, é o procedimento relativo ao julgamento da licitação. A Lei 8.666/93, nesse assunto, esgotou o tema e não permitiu outro entendimento sobre a ordem das fases: 1º a habilitação; 2º a proposta. Qualquer alteração nessa ordem não poderá ser vista como “complementação”, mas escandalosamente como “alteração” da norma geral.

Inverter as fases, abrindo-se primeiro a proposta e depois a habilitação, somente é admissível por meio de Lei Federal, cuja matéria pertence à competência legislativa privativa da União. Aos Estados e Municípios, como já foi dito, é facultados o poder regulamentar suplementar, ou seja, de regular aquilo que a Lei Federal foi omissa ou deixou a lacuna.

Uma vez que a Constituição Brasileira não permitiu, é inadmissível que Estados e Municípios venham a alterar as normas gerais, fazendo verdadeira intervenção cirúrgica e criando novas regras e leis desfiguradas. Esse é o caso da alteração das fases, nas modalidades Concorrência, Tomada de Preços e Convite.

Indubitavelmente, é ilegal promover-se o julgamento da proposta antes da habilitação nas modalidades convencionais definidas na Lei 8.666/93, visto que a norma geral definiu peremptoriamente este procedimento. Alterar essa regra geral equivaleria à criação de nova modalidade, o que é terminantemente vedado pela Lei: “art. 22 – …; § 8º É vedada a criação de outras modalidades de licitação ou a combinação das referidas neste artigo”.

Quanto à fase saneadora, ou seja, destinada a corrigir falhas e erros da documentação, cabe esclarecer.

Aos Estados e Municípios:

a) não é possível estabelecê-la na Concorrência, Tomada de Preços e Convite, vez que o artigo 43, § 3º, da Lei 8.666/93, fixou clara e exaustivamente o poder de promover diligência, vedando-se a inclusão posterior de documento ou informação que deveria constar originariamente da proposta; dessa forma, não se poderia abrir possibilidade da correção de vícios documentais, porquanto a Lei 8.666/93 preceituou definitivamente a vedação à juntada posterior de documentos; a apresentação de novos documentos é definida excepcionalmente, também de forma exaustiva, pelo artigo 48, §3º.

b) já no Pregão, a fase saneadora é possível à medida que a Lei Federal nº 10.520, que criou a nova modalidade, não definiu a matéria, possibilitando o exercício da competência suplementar quanto ao julgamento dos documentos de habilitação.

Por fim, cabe alertar que as alterações das regras e procedimentos em licitações e contratos administrativos, já definidos e exauridos pelas normas gerais, só admitem modificação através de Lei Federal em face da competência privativa da União. Aos regulamentos Estaduais, Municipais e do Distrito Federal, caberá a complementação daquilo que não foi definido ou delimitado pela norma geral.

No tocante à decisão da Administração __________ de conceder novo prazo para escoimar os vícios da documentação no prazo de 3 (três) dias, no processo licitatório instaurado sob a modalidade de Convite, necessária se faz  a interpretação sistemática, ou seja, aquela em que analisar-se-á o preceito contido nos §§ 5º e 6º do artigo 78 da Lei Estadual nº 9.433/95, à luz do artigo 43, § 3º, da Lei 8.666/93 que definiu as normas gerais em licitação.

Em que pesem os dispositivos da Lei Estadual permitirem a diligência destinada a esclarecer ou a complementar a instrução do processo, a vedação à inclusão posterior de documentos deve persistir em razão da norma geral definida pelo artigo 43, § 3º, da Lei 8.666/93.

Qualquer “norma” ou “interpretação de norma” que venha contrariar ou modificar a regra já existente, deverá ser considerada ilegal.

Nessa esteira, o § 5º do artigo 78 do diploma estadual, permite a diligência, contudo, não admite a juntada posterior de documento que deveria constar originariamente da documentação apresentada no certame.

A análise isolada do § 6º do mesmo artigo, permitiria a juntada de documento cujo conteúdo retrate situação fática ou jurídica já existente, todavia, não é o caso para o licitante ____, pois o mesmo apresentou cópia simples de documento que sequer admite-se a existência ou os efeitos no mundo fático e jurídico; cópia simples não produz efeitos, portanto, não existe; no entendimento do STF (RTJ 108/156) as reproduções fotográficas não autenticadas não constituem documentos. Com efeito, o permissivo do § 6º não se aplicaria ao licitante ____ pois não houve situação fática ou jurídica pré-existente uma vez que o conteúdo do documento não autenticado deve ser considerado inexistente. Sob o ponto de vista da interpretação sistemática, seria inadmissível a juntada de documento posterior da licitante _____ que, na verdade, substitui aquele apresentado na licitação; não se trata, portanto, de informação ou documento destinado à complementação do processo, mas verdadeira substituição processual.

(Colaborou Ariosto Mila Peixoto, advogado especializado em licitações públicas e contratos administrativos).

*Alguns esclarecimentos foram prestados durante a vigência de determinada legislação e podem tornar-se defasados, em virtude de nova legislação que venha a modificar a anterior, utilizada como fundamento da consulta.

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