ContratosQuestões sobre Licitações

O atraso nos contratos administrativos

“Qual o efeito no contrato administrativo decorrente do atraso no pagamento por parte da Administração Pública”?

Primeiramente, é importante observar o prazo de atraso do pagamento: a data para início da contagem será a data em que a nota era efetivamente exigível (data do vencimento), ou seja, a partir do dia em que o valor passou a ser devido (não necessariamente esta data coincide com a data do faturamento).

Caso tenha decorrido o interregno mínimo de 90 dias contados da data da exigibilidade da fatura sem pagamento, a contratada poderá requerer que seja formulada a rescisão do contrato, podendo, ainda, optar pela sua suspensão até que seja normalizada a situação (art. 78, XV, da Lei 8.666/93).

Entendo que a partir do momento que exista um motivo para rescisão, a contratada poderia, de forma unilateral, comunicar o fato e considerar rescindido o contrato, vez que é um direito que lhe cabe. Tal conduta tem justificativa no fato de que não se pode esperar que a Administração, de livre e espontânea vontade, rescinda o contrato quando ocorrer a hipótese do artigo 78, XV, mesmo porque, a Administração pode não promover a rescisão, manter o atraso e, ainda assim, querer punir a empresa pela suspensão do contrato. A empresa contratada não é obrigada a financiar a Administração Pública, principalmente porque na proposta vencedora da licitação observava-se uma equação econômico-financeira bem como condições de execução contratual que deveriam ser respeitadas pelas partes.

As partes têm ciência das conseqüências resultantes do descumprimento; se a contratada descumpre o contrato, merece as penalidades da lei; se a contratante não obedece as disposições contratuais, sabe que a contratada, por menor que seja o seu direito, pode pleitear a interrupção definitiva da avença. Portanto, ocorrendo uma das hipóteses do artigo 78, seria justo que a parte prejudicada pudesse promover a rescisão do contrato.

Mesmo tendo esse entendimento, há correntes que consideram a rescisão (com base no art. 78, XV)  possível apenas com autorização judicial. Dessa forma, sugiro que a contratada (por zelo) faça a comunicação da suspensão do fornecimento bem como, para que a Administração promova a rescisão. Caso a mesma não tome providências, a contratada deverá (por segurança) pleitear a rescisão na esfera judicial.

 

Jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (AC 199904010345810):

“ADMINISTRATIVO. CONTRATO PARA FORNECIMENTO DE COBERTORES. EXCEÇÃO DO CONTRATO NÃO CUMPRIDO.
– Se o descumprimento integral da segunda parte do contrato pelo particular decorreu exclusivamente do atraso no recebimento do preço acordado com a União, acarretando prejuízo insuportável ao contratado, está justificada a invocação da “exceção do contrato não cumprido”.
– Inobstante os contratos administrativos estarem submetidos a regime jurídico próprio em que tem lugar a supremacia do Poder Público, esta não pode ultrapassar os condicionamentos do Estado Democrático de Direito.
– A União, ao deixar de cumprir a cláusula atinente às condições de pagamento, parcelando o preço, procedeu a verdadeira alteração do contrato, violando o princípio do equilíbrio econômico-financeiro; por isso, não encontram respaldo legal a rescisão do contrato pela União assim como a cominação das penas de multa e advertência.
– Mantida a sentença que rescindiu o contrato com fundamento no art. 78, XV, da Lei nº 8.666/93, condenando a ré ao pagamento devido nos termos do art. 79, §2º.
– Honorários advocatícios elevados para 10% sobre o valor da condenação, na esteira  dos precedentes da Turma.
– Prequestionamento quanto à legislação invocada estabelecido pelas razões de decidir.
– Apelação da autora provida. Apelação da União e remessa oficial improvidas.”

 

(Colaborou Ariosto Mila Peixoto, advogado especializado em licitações públicas e contratos administrativos).

* Alguns esclarecimentos foram prestados durante a vigência de determinada legislação e podem tornar-se defasados, em virtude de nova legislação que venha a modificar a anterior, utilizada como fundamento da consulta.

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